Coronavírus: Brasil “de cima” se conscientiza mais lentamente

Por Moura Nápoli

Márcio – no destaque – tem na boleia de seu caminhão seu segundo lar, onde corta o Brasil de Norte a Sul (Foto: Arquivo Pessoal)

O Brasil é um país de dimensões continentais e, com isso, há uma pluralidade de costumes. O Periscópio manteve contato com um caminhoneiro ituano Márcio Oliver, 54, que atualmente está radicado em Anápolis/GO. Casado e pai, Márcio ganha a vida cruzando as estradas do país e pode ver bem a situação principalmente fora do eixo Rio-São Paulo.

Na estrada há mais de 30 anos, Márcio diz que “logo que começou essa história do coronavírus, as pessoas aqui em Goiás não deram muita importância. Barzinhos abertos, pessoas nas ruas… As pessoas foram caindo em si aos poucos e depois que a mídia começou a divulgar mais abertamente. Em Brasília muita coisa fechada, mas em Salvador vi muita aglomeração de pessoas, turma tomando cerveja como se fosse feriado”.

Da Bahia, Márcio Oliver seguiu ao Piauí, onde, “apesar da polícia estar em cima, também havia muitos estabelecimentos abertos. Hoje as coisas já estão diferentes. Aqui em Anápolis está tudo fechado, o governador de Goiás [Ronaldo Caiado, do DEM] está ciente da gravidade. Mas no Norte e Nordeste as coisas andam mais devagar”, afirmou.

No giro que o caminhoneiro fez, saindo de Anápolis até o Piauí, Marcio disse que “os postos de gasolina estão abertos, mas era muito difícil encontrar restaurantes funcionando, banheiros imundos, fiquei praticamente três dias sem comer, só tomando água. Quando se encontrava um restaurante, não havia álcool em gel, detergente, nada, nenhum apoio a nós, caminhoneiros. Tudo muito complicado. Não é por acaso que 32% dos motoristas estão querendo parar”.

Ele diz, entretanto, que “aos poucos movimentos religiosos e a Polícia Federal Rodoviária estão fazendo campanhas para distribuir marmitas e produtos de higiene de primeira necessidade para os caminhoneiros, o que vai nos ajudando”. Márcio é consciente de que sua classe é muito vulnerável. “A gente passa ora aqui, ora ali e fica pensando na família, em quarentena em casa… Vida de caminhoneiro é dura. É coisa que eu amo, mas não é fácil”.

Márcio Oliver é casado e tem quatro filhas e dois netos que moram na sua casa. “Tenho uma filha que atualmente mora na França. A gente conversa muito por telefone, mas ela chora, quer voltar, mas não pode porque está de quarentena. Ela, entretanto, está bem amparada lá e a gente deixa nas mãos de Deus”.

Hoje – e isso já perdura por aproximadamente 35 anos –, Márcio é caminhoneiro. Mas ele, bem jovem, trabalhou no Periscópio, começando como entregador até ter um laboratório em que revelava as fotografias do jornal. Depois encontrou-se como caminhoneiro e assim constituiu família e, apesar de todos os sufocos e incertezas, realizou-se profissionalmente.