Crítica da peça Hamelin

Foto: Fernando Henrique

Por Rafael Cavacchini

“Isto não se trata de uma coletiva de imprensa, ouviram bem?”, disse, em tom ríspido.

Silêncio.

Monteiro, de pé atrás de sua escrivaninha, falava aos jornalistas diante de si. A respiração dos presentes estava pesada. O escritório, parcamente iluminado, dava àquela cena um ar tenso e sombrio.

O homem prosseguiu, dizendo tudo o que queria dizer, sempre com uma voz firme e austera. Quando terminou, virou-se para olhar através da sua janela, observando a única luz acesa no prédio vizinho. Ainda falou por vários minutos, mas não dialogava mais, apenas devaneava.

O menino sente medo, mas seu pai não sabe do que ele tem medo. Do que tem medo o menino da janela? 

Sentado no assento mais privilegiado do teatro, eu assistia hipnotizado ao desenrolar daquela cena, enquanto Juliano Mazurchi, no papel do juiz Monteiro, vociferava as palavras com a precisão milimétrica de alguém que conhece bem sua personagem, com uma dicção de dar inveja mesmo aos melhores oradores.

Não havia como não ser capturado por aquela atmosfera. E que atmosfera! “Hamelin”, de Juan Mayorga, é um espetáculo ousado. E não apenas por ser uma peça dramática em uma cidade pouco acostumada ao drama, mas também por tocar em um tema muito delicado: pedofilia.

Com execução impecável, diga-se de passagem,o espetáculo tem a direção do sempre brilhante Ricardo Vandré, e conta com um magnífico elenco de atores com vasta experiência teatral e longa estrada artística, como Alessandro Franco, Alessandre Pi, Christian Hilário, Regina Rebello e o já citado Juliano Mazurchi, todos também diretores consagrados de teatro. Também faz parte do elenco o jovem prodígio Will Bassi, estreante na peça, que protagoniza momentos de sofrimento e dor que causam ansiedade e emocionam a plateia, nesta que é uma peça angustiante e atormentadora, do começo ao fim.

“Hamelin” surpreende com uma trama densa e questionadora, que aborda com classe temas delicados e sombrios. Uma história envolvente, dessas que permanecem ecoando dentro do espectador muito tempo depois de ter deixado o teatro. “Hamelin” não é apenas o tipo de espetáculo que Itu precisa: é muito além do que a cidade esperava.

Definitivamente, um drama que fará você rever seus conceitos.

Recomendadíssimo.    

 

Espetáculo “Hamelin”

Onde: Teatro Nósmesmos (Av. Prudente de Moraes, 210, Vila Nova)

Quando: Hoje (24), às 20h, e amanhã (25), às 19h

Ingressos: R$ 40 (R$ 20 meia-entrada)

Informações: (11) 99698-0208