Dia Nacional dos Surdos: luta pela inclusão na sociedade ituana

Flávia relembra sua trajetória e comenta sobre inclusão (Foto: Arquivo pessoal)

Neste sábado (26) é celebrado o Dia Nacional dos Surdos, que tem como objetivo propor a reflexão e o debate sobre os direitos e a luta pela inclusão das pessoas surdas na sociedade.

No Brasil, a Lei nº 10.436/2.002 foi um marco importante para a comunidade surda brasileira, ao reconhecer a Libras (Língua Brasileira de Sinais) como meio legal de comunicação e expressão, além de determinar o apoio na sua difusão e uso pelo poder público. De acordo com dados do Ministério da Saúde, os surdos constituem 3,2% da população (aproximadamente 5,8 milhões de pessoas).

Lembrando a data, o Periscópio traz a trajetória da professora de Libras Flávia Trevisan Ferreira da Silva, de 32 anos, que, aos dois anos de vida, teve descoberta sua surdez. “Eu estava no ‘mundo do silêncio’ e seguia os gestos e mímicas caseiras. Naquela época, acredito que não tinha teste de orelhinha, por isso meus pais suspeitaram, um tempo depois, da minha deficiência”, conta.

Segundo ela, seus pais resolveram a levar ao otorrino e fizeram audiometria. “Fui diagnosticada com surdez profunda bilateral, mas, na verdade, depois fui avaliada melhor, somente no ouvido direito é profunda e no esquerdo é severa. Na minha família, não tem ninguém surdo, somente eu”, relata.

Com o diagnóstico, de acordo com Flávia, o apoio e a ação da família foram fundamentais para sua formação. “A reação foi a melhor possível, o meu pai disse que deveriam me tratar como uma menina normal, sem proteger em nada. Eu deveria ser como as outras crianças, embora exigisse um trabalho diferente para que pudesse me desenvolver”.

A ajuda dos familiares foi essencial. “Nessa época a minha tia Angélica ajudou a produzir material didático que estimulasse os desenhos, nomes das coisas, letras, cores e assim por diante, pois, naquela época, havia pouco material didático disponível no mercado. Além da minha tia, a minha mãe também fazia dinâmica comigo em casa”.

O apoio dos pais (Mauro Paulo e Maria Helena) à Flávia possibilitou também, posteriormente, o auxílio a outros pais e seus filhos. Com dificuldades de locomoção constante para Campinas, cidade em que iam para atendimentos médicos especializados, eles decidiram trazer os profissionais para Itu e, juntamente, com outros pais, fundaram em outubro de 1992 a Associação de Pais e Amigos dos Deficientes Auditivos de Itu (APADAI).

Antes da fundação da associação, no entanto, o desenvolvimento de Flávia teve início com a utilização de aparelhos auditivos, aos três anos de idade. “Até hoje uso, não

consigo ficar sem eles, pois no ‘mundo do silêncio’ me sinto insegura, principalmente quando estou na rua ou não consigo compreender algumas palavras”.

      Flávia acrescenta: “Quando estou fazendo leitura labial, usando aparelho, escuto alguns sons e vozes e isso me tranquiliza. Mas você pode me perguntar como eu consigo ouvir as vozes? Com estímulos fonoaudiólogos que tive quando criança. O uso do aparelho auditivo me proporcionou novas experiências sonoras, aprendi as duas línguas: português e Libras. Eu falava o nome das figuras através da voz e com Libras, simultaneamente. Essa metodologia era usada como comunicação total”.

 Ela recorda. “Uma fonoaudióloga me ensinava a ouvir os sons através de uma fita cassete (chuva, choro de bebê, latido de cachorro…) e eu apontava o desenho o qual se referia aos sons. Desde pequena gostava de ouvir música, como tinha perda severa em um lado, eu acompanhava as letras junto com a música até gravar e assim consegui a amar as músicas e também falava por telefone. Mas, infelizmente, desde uns 27 anos, eu perdi a severa para profunda e aí não consigo mais falar no telefone como antigamente e também não consigo mais captar algumas falas nas músicas”.

  Formada em Administração de Empresas e em Letras Libras, Flávia trabalhou no ano passado como Educadora de Libras no Museu da Energia de Itu. “Surgiu uma nova oportunidade de trabalhar diretamente com os surdos e ouvintes que sabem Libras. Alguns deles já estiverem nesse Museu, mas não sabiam o quanto a história é importante e, na época que vieram, não tinha acessibilidade de Libras, e isso é muito importante que tenha em todos os Museus e que os surdos presenciem e vivenciem o passado como era”.

Dificuldades

 Casada com Vilson da Silva, que também é surdo, Flávia fala sobre as dificuldades enfrentadas. “Hoje em dia estamos tendo dificuldade muito grande de barreiras, principalmente nas redes sociais, televisão e outros por falta de legenda ou janela de Libras. A gente sente excluído nesse mundo dos ouvintes e também nas informações importantes que vêm acontecendo no dia a dia”.

 Na visão dela, a língua de sinais é essencial. “A gente não fica sabendo de nada o que está acontecendo e ficamos sabendo através de alguém que sabe Libras tardiamente. A  Libras foi reconhecida como a segunda língua oficial do Brasil, é muito importante em todos lugares na sociedade saibam Libras, que fica mais fácil de comunicar, por exemplo, nas farmácias, nos hospitais, nos consultórios, supermercados e lojas”.

 A professora de Libras aproveita para esclarecer um termo. “Nos jornais, percebi que todos colocam deficiente auditivo. Os surdos não gostam que chamem deficiente auditivo, isso é senso comum, se olhar para nós não temos deficiências graves, só apenas audição, então, quando colocar notícias, informe surdo ou surda, que aí sim fica mais leve e bonito”, conclui.