Espaço Acadil: O Natal de Nikodemus

Guilherme Del Campo
Cadeira nº 11 I Patrono Mario de Andrade

Nikodemus (nome fictício), brasileiro, casado, pai de três filhos, caminhoneiro, 40 anos. Motorista experiente transportava cargas pelo Brasil afora. Herdou a profissão do pai, já falecido. Desde criança andava na boleia do caminhão,geralmente nas viagens curtas e aprendeu a amar a profissão.

No mês de outubro de 1999 levava uma carga para Salvador/BA e estacionou seu caminhão para almoçar e descansar. Foi surpreendido por 3 assaltantes quando teve tudo roubado. Durante o assalto um deles o acertou na cabeça e ele desmaiou.

Ficou jogado à beira da estrada e não apareceu ninguém para socorrê-lo. Ao acordar, horas depois, não se lembrava de nada. O golpe na cabeça sangrava e provocou um coágulo no cérebro. Com isso perdeu a memória.

Começava aí um calvário. Não sabia quem era, se tinha uma família e onde trabalhava e nem se recordava do seu caminhão. Perambulando pelas estradas acabou em Salvador e passou a viver nas ruas, sobrevivendo de esmolas.

Após um ano ele aprendeu com os moradores de rua, a apanhar latinhas e papelões para revender e ganhar alguns trocados. A memória não voltou e ele sofria muita dor de cabeça. Sua família procurou desesperadamente por notícias, visitando hospitais, delegacias, postando fotos em jornais… Considerou-se que ele estava morto ou desaparecido.

No início de dezembro de 2001, repórteres faziam documentário sobre os moradores de rua e ele foi filmado.

Na casa da família dele e longe dali foi reconhecido. Imediatamente os filhos se organizaram e viajaram para Salvador para reencontrá-lo. Não foi tarefa fácil. Perguntavam pelo nome, mas ninguém dava informações concretas. Mostraram fotografias e de pouco adiantou. Há muito ele andava cabeludo e barbudo.

Quando estavam quase desistindo houve um golpe de sorte. Eles observaram um homem carregando um fardo de papelões e se aproximaram – Era ele! Que alegria!

No começo ele refutou a presença dos filhos, mas diante das evidências e das fotos apresentadas, concordou que era ele. Levado a um hospital e após exames minuciosos, constatou-se que ele tinha um coágulo no cérebro. A operação foi bem sucedida.

Aos poucos a memória foi voltando e ele recordou-se de tudo. Retornou para sua terra natal, Cariacica/ES e seu caminhão estava lá, recuperado pela polícia.

Com alegria, sua esposa e a família organizaram uma festa de Natal e convidaram todos os amigos. A vizinhança preparou uma recepção com uma faixa de boas-vindas.

Na Noite de Natal todos se ajoelharam e rezaram agradecendo a Deus a graça recebida. Foi uma festa de grande emoção e Niko como era então chamado pelos íntimos voltou feliz ao seu trabalho de caminhoneiro e junto dos seus. Deus seja louvado!

Nota: Essa história me foi contada pelo próprio em julho de 2010, num posto de gasolina no Rio Grande do Sul.