LEMBRANÇAS DE MEU PAI

Escrever muitas vezes representa uma verdadeira caixa de surpresas. De repente nos conduz a distantes horizontes, levando-nos a temas completamente inesperados.

Para poder escrever este artigo, eu precisaria da autorização de uma pessoa muito especial para mim: meu pai. Ele é o personagem principal desta história.

Só que não foi possível encontrá-lo para obter a autorização, porque ele já se foi deste mundo há mais de 30 anos.

Em fins do ano de 1998, com a morte de minha mãe, coube a mim, uma de seus seis filhos, dar entrada no inventário da família. Entre os documentos, havia um significativo acervo de pequenos bilhetes manuscritos com a letra inconfundível de meu pai.

Aquilo me fascinou e imediatamente me veio o desejo de selecionar todas aquelas anotações.

Para organizar tive que me curvar em cada detalhe. Foi preciso rever álbuns de fotos, para identificar alguns parentes referidos nos manuscritos já amarelados pela ação do tempo.

Para obter um melhor entendimento de todo esse material, contatei irmãos, parentes e amigos de meus pais. Foram momentos intensos de doces encontros de sentimentos.

Durante meses colhi centenas de bate-papos rápidos, casuais e prazerosos. O resultado mostrou o quanto algumas pessoas são capazes de guardar fatos na memória e revelá-los em uns poucos minutos de conversa.

O encanto disso tudo foi a certeza de que quando só pensamos sobre um assunto, somos menos claros e definidos, mas quando escrevemos, somos obrigados a, pelo menos, ter uma redação bem estruturada e definida.

Todo esse trabalho, de ordem sentimental, não teve como pretensão fazer uma obra literária e nem mesmo montar uma árvore genealógica, mas permiti fazer um balanço do que a vida ofereceu ao meu pai e de como ele lidou com as pessoas e fatos.

Casos quase esquecidos são revividos, perdas marcantes podem ser mais bem aceitas, há possibilidade até de perdoar as pessoas que causaram, talvez, mágoas. Os fatos do passado não podem ser mudados, mas a interpretação que damos a eles, sim.

Na verdade, o mundo se transforma sempre com a sabedoria que costuma ser um prêmio da maturidade, a pessoa tem força para um mergulho dentro de si mesma. Comparando opiniões, corrigindo mal-entendidos, acertando sentimentos. Com tudo isso pude adquirir uma compreensão mais completa da trajetória de vida do meu pai. E é aí que o inevitável acontece, pois vem o entendimento de algumas de suas atitudes e até de suas impetuosas decisões.

Refletindo a respeito destes achados todos posso dizer que pude chegar tão perto do meu pai, que quase o toquei com as minhas mãos. Tal experiência foi muito positiva para o lado emocional, como, também, estes escritos todos transformaram-se hoje num emocionante presente para nossa família.

Que bom! Deus é mesmo de uma ternura e uma delicadeza incrível. Depois de tanto tempo pude recuperar e compreender melhor minhas raízes e conhecer fatos marcantes da família, do ponto de vista de meu pai.

Paro de escrever e faço uma oração. Uma oração à vida. E uma prece ao meu pai. Por tudo que fez e o exemplo que me deixou.

Sua filha Ditinha Martin Schanoski

Acadêmica e jornalista.

Ditinha Schanoski
Cadeira nº 19 | Patrono Professor Benedito Motta Navarro