OS MENINOS DO GRUPO ESCOLAR

Após “Os Meninos de 58” e “Os Meninos das Matinês”, encerro esta trilogia com “Os Meninos do Grupo Escolar”.

Ingressei no Grupo Escolar Dr Cesário Motta, em Itu, no ano de 1952 antes de completar sete anos. Na época não havia pré-primário. Assim, jamais fui iniciado no mundo da socialização infantil, nos relacionamentos e brincadeiras entre crianças.

Eu não possuía a vivência, a malandragem da garotada que me rodeava. Não entendia seu código fonético e seus trejeitos, entre outras patifarias. O que mais incomodava era o barulho. A criançada gritava, os serventes gritavam e as sisudas professoras não cessavam de gritar aos nossos ouvidos.

Em louvor à institucionalizada decoreba estridente, predominavam os cruéis castigos físicos. As megeras batiam com suas grossas réguas nas mesas, na lousa e nas costas das nossas pequeninas mãos, castigando-nos por motivos fúteis. Bastava esquecer uma lição. As pancadas provocavam bolhas e vergões, lágrimas, indignação e vergonha. Ignorava-se que letras bonitas ou garranchos faziam parte da nossa individualidade, da identidade de cada aluno.

Professoras que chegaram a empunhar as temidas palmatórias e obrigar as crianças a ajoelhar-se sobre grãos de milho, sem remorsos. Se contássemos em casa que fomos castigados, ganhava-se uma surra. Aliás, era comum castigarem severamente os filhos. Para isso mantinham varas de marmelo, rabos de tatu, cintas de couro ou ripas de madeira atrás das portas.

Desculpem-me a sinceridade. Excluindo raras exceções sou extremamente cético quando prestam excessivas homenagens ou tecem exagerados elogios aos professores que exerceram sua cátedra dentro daqueles padrões. As únicas explicações possíveis: hipocrisia, memória fraca ou alunos que tiveram melhor sorte.

Em nome daquele regime ditatorial e de ordem absoluta, as professoras fomentavam o medo. Ameaçavam-nos com visitas ao dentista, com suas terríveis brocas movidas a pedal, ou a aplicação das vacinas obrigatórias.

Talvez essa cega e beligerante atitude fosse fruto da insegurança e medo que as professoras sentiam ao enfrentar classes superlotadas, mescladas de repetentes mais velhos.

Éramos tratados como adultos pequenos e nunca como meninos curiosos, ignorantes e ávidos do saber. Havia classes masculinas e femininas. Faltava carinho e compreensão. A disposição hostil desses educadores explicitava-se nos cadernos repletos de interrogações, exclamações e flechas invariavelmente com tinta vermelha.

O que mais causava indignação e revolta era aquele olhar de escárnio, censura e nojo a nós dirigido. Ao rever um antigo álbum de fotografias, deparei-me com uma foto tirada no Grupo Escolar, onde apareço com minha turma. A imagem é chocante, todos os alunos estão sérios e tristes, de braços cruzados e não há sorrisos. Lembra um campo de concentração nazista.

Comparando essa imagem com fotos recentes, tiradas dos alunos da minha esposa, observei uma diferença brutal. As crianças apresentam-se saudáveis, alegres e felizes. Mostram laços de amizade entre meninos e meninas, abraços afetuosos, sorrisos nos lábios e olhos brilhantes.

Deus seja louvado!

 

Guilherme Machado Del Campo

Cadeira nº 11 | Patrono Mario de Andrade