Professor João dos Santos Bispo: educador

Por Maria Angela Pimentel Mangeon Elias

Algumas escolas têm um certo quê de santuário. Assim era o Instituto de Educação Estadual “Regente Feijó” quando cheguei a Itu como Professora Efetiva de Inglês. Inesquecível esse tempo que deu novo rumo às nossas vidas, de meu marido, de meus filhos e minha. Sabia que Itu era importante cidade, porém não a conhecia.

Aqui chegamos, meu marido e eu, no mês de maio, em plena comemoração da Festa do Divino. Além disso, no dia do aniversário do Instituto de Educação, feriado escolar, portanto.

Ao saber que a Professora de Inglês estava na cidade, o Diretor fez questão de abrir o prédio da escola e deu-lhe posse imediata, acrescida de convite para o jantar comemorativo, com professores e funcionários, no Hotel Central,  onde nos achávamos hospedados.

Impressionou-nos a nímia gentileza do Diretor, não só por abrir as portas da Escola para nos receber, mas também por nos integrar imediatamente á comunidade de mestres e funcionários. Fatos e atitudes inesquecíveis!

Assim era o Professor João dos Santos Bispo, dileto amigo, que imprimiu ao Instituto de Educação Regente Feijó sua maneira de ser, cordial, afável e, principalmente respeitosa, características de sua personalidade ímpar.

Falar de João Bispo é falar de amor, amor a Deus, amor à Família, amor à Língua Pátria, amor à Educação, amor a Itu… E a identidade da “sua Escola” se fundia  à sua própria identidade! Sua usual brandura se transformava, entretanto,em grande veemência quando se tratava de defender os brios do educandário querido.

Em Casa Branca, onde iniciou sua vida profissional, no Colégio Estadual e Escola Normal Dr. Francisco Tomaz de Carvalho, deixou a marca de sua conduta ínclita. Lá foi Professor, Vice-Diretor e Diretor.

Casou-se, em 1944, com a jovem Laura Castro Cintra, da sociedade casa-branquense e formaram alegre e hospitaleira Família.

O Professor João Bispo orgulhava-se de ser formando da Primeira Turma do Ginásio Estadual, em 1946. O Ginásio Municipal tornara-se Estadual em 1932; mais tarde Colégio Estadual e Escola Normal; depois Instituto de Educação Estadual“Regente Feijó”, uma das glórias do Ensino Paulista.

Após iniciar seus estudos no Externato São José, anexo ao Colégio Nossa Senhora do Patrocínio, sob a benfazeja atenção das Imãs de São José de Chambéry, o garoto João depois cursou o Grupo Escolar Dr. Cesário Mota Júnior e  o Ginásio Estadual, em Itu.

Em São Paulo formou-se Professor na Escola Normal do Ipiranga.  Dedicado aos estudos, foi para o Rio de Janeiro estudar Medicina na Faculdade da Praia Vermelha. Logo, no entanto, sentiu ser outra sua vocação. Novamente em São Paulo, licenciou-se em Pedagogia pela Faculdade São Bento. Consideramos que daí surgiu sua predileção pelos Monges Beneditinos. Repetia sempre o lema: “Ora et Labora”.

Por Concurso de Remoção do Magistério Oficial do estado de São Paulo voltou à sua cidade natal, como Diretor do Instituto de Educação Estadual Regente Feijó, onde permaneceu por quase vinte e cinco anos, aposentando-se em 8 de novembro de 1977.

Aprendi muito com o Professor João dos Santos Bispo, mestre por excelência. Logo convidada para ser Vice-Diretora no período da tarde, não tive dúvidas em liberar um pouco do tempo de magistério, que sempre me encantou, para colaborar na administração do modelar estabelecimento de ensino.

Admirava seu modo de dirigir, pelo exemplo que dava a todos, respeitosamente postado no saguão de entrada do prédio, à espera dos Professores. Com passos lentos percorria os amplos corredores, tudo observando e tudo mentalmente registrando para depois tomar as providências necessárias.

Jamais desconsiderava os Professores, os funcionários e os alunos. Visitantes e autoridades eram recebidos com cordialidade e afabilidade, qualquer que fosse sua condição social. Dizia-me sempre: “Minha filha, é preciso dar tempo ao tempo”. Assim as soluções ficavam mais justas.

Nossa família teve o privilégio de conviver com a dele, no casarão da Rua Barão do Itaim, sempre de portas abertas, de aspecto impecável devido ao zelo e cuidado da Laura, e com belo jardim interno. Com janelas dando para a rua lá estava a famosa Biblioteca do Professor João dos Santos Bispo. Era o seu refúgio, onde lia e ouvia seus discos preferidos. Móveis de estilo e bom gosto enfeitavam esse local especial.

Nas cerimônias da Semana Santa, tradicionalmente realizadas em Itu, sua casa era escolhida para a construção de um Altar dos Passos. Apesar dos inúmeros convites recebidos, sempre declinou de ocupar altos cargos políticos, tanto municipais como estaduais. Prezava muito sua autonomia de pensamento e de ação, dizia.

Condecorações teve muitas. Entre elas, quero citar a Medalha Domingos Fernandes e a Boina Preta do Exército Brasileiro, recebida em cerimônia no Quartel do Regimento Deodoro, em Itu. É sócio emérito da Academia Ituana de Letras – ACADIL.

Incontáveis são as honrarias na área da educação. Por ocasião de sua aposentadoria assim se expressou Sólon Borges dos Reis: “Após mais de trinta e cinco anos de serviços prestados à causa da Educação, aposentou–se recentemente uma das mais fecundas vocações de educador e administrador Escolar: o Professor João dos Santos Bispo, que era diretor do Instituto de Educação Estadual Regente Feijó da tradicional Itu”.

Foi tribuno de excelência. Seus dotes pessoais e literários ficavam patentes nas memoráveis e inúmeras ocasiões em que era quase intimado a falar, em diferentes comemorações sociais, políticas e religiosas. Simplesmente inefável era a emoção de ouvir sua voz firme e resoluta, ver seus gestos elegantes e contidos. Uma maravilha!

Faleceu em 27 de julho de 2013, com noventa e três anos e perfeitamente lúcido! Neste ano de 2020, que nos leva a tantas e tamanhas reflexões, comemoraremos seu centenário, no dia 5 de agosto, lembrando suas preciosas palavras: Laissezfaire, laissezpasser!

Deixou o exemplo de Serenidade!

Deo Gratias!