QUADRO NEGRO

A tela do computador estava em branco, um canvas digital à minha espera. E logo esse vazio se preencheu com imagens e ideias para um curso de história da arte… Aqui vai o mictório de Marchel Duchamp, bem no começo, depois, a Guernica de Picasso e sua crítica à guerra e à violência… Agora, a vez de Kandinsky, com seu abstracionismo… Ou não.

Será que os alunos vão implicar com arte russa?

Paro de montar os slides, surpreso por um medo repentino – a indagação do que vão pensar sobre o conteúdo. Já não bastava o salário, os três turnos de trabalho, a sala lotada sem ventilador, todos desmotivados, apenas juntos naquele tempo e espaço por mera formalidade contratual… E mesmo assim surge um novo fantasma, o medo do professor doutrinador. Mal conseguimos ensinar o conteúdo básico e agora implicam que o maior problema da educação são os educadores.

Doutrinação? Ora, o mundo é uma guerra de ideias, sempre foi e será. Cada mensagem, cada ferramenta, cada ação pensada pelo homem é voltada para um objetivo e, portanto, tem uma carga política. Não conseguimos atingir a neutralidade pois não há isenção na humanidade. Picasso poderia ficar neutro em frente à guerra civil espanhola? Não pintar a Guernica é uma ação ideológica tanto quanto pintar a Guernica. O que fazer então, diante das ideias?

Saber recebê-las, interpretá-las, criticá-las. Ideias não são balas mágicas, que engolimos e aceitamos sem questionar – temos o nosso senso crítico, e o poder de ponderar. A autonomia do pensamento do estudante, esse é o Santo Graal que buscamos mais do que o simples conteudísmo. Nós professores estamos aqui para ajudá-los a interpretar esse mundo, somos falhos também – isso é certo, mas não nos cerquem e digam o que o mundo deve ser, porque isso é a verdadeira doutrinação. O mundo é uma guerra de ideias, sempre foi e será. E a Guernica do pensamento humano seguirá seu caminho não suave, pois educamos para sempre questionar e não para sempre aceitar.

Texto em homenagem aos meus professores de jornalismo do CEUNSP

Jean-Frédéric Pluvinage
Cadeira nº 15 | Patrono Dr. Salathiel Vaz de Toledo