Rio Tietê: poluído até quando?

Foto: Amauri Aparecido Zardeto/Wikimedia Commons

A palavra “Tietê” é de origem tupi e significa “água verdadeira”, com a junção dos termos ti (“água”) e etê (“verdadeiro, grande, fundo, que corre para baixo”). Mas, quem hoje observa o degradado Rio Tietê, vê tudo menos água de verdade. Garrafas pet, sacolas plásticas e embalagens diversas são comuns na paisagem de um dos principais cursos d’água do Estado de São Paulo.

No próximo dia 22 de setembro será celebrado o Dia do Rio Tietê, data que visa a conscientização pela despoluição do rio. Antes limpo e aberto à navegação, o Tietê hoje é o retrato da poluição causada pelo homem. Segundo a Sabesp, por dia são lançados 3 bilhões de litros de esgoto e dejetos industriais, uma média de 35 mil litros por segundo, na região metropolitana de São Paulo. Por essa razão, o trecho que cruza São Paulo e as cidades vizinhas é considerado morto, sem oxigênio e extremamente prejudicial à saúde.

O impacto de toda essa sujeira despejada no rio pode ser sentido em cidades da região, principalmente Salto. Anualmente o trecho saltense do Tietê é cenário de tristes imagens, com água tóxica, mortandade de peixes e enchentes em diversos pontos – o que também foi sentido por Itu em 2020, no Jardim Paraíso.

Nesse sentido, uma das entidades que batalham pela causa do rio é o INEVAT – Instituto de Estudos do Vale do Tietê, que tem cerca de 30 anos de atuação. Recentemente, o engenheiro geotécnico Ismar Ferrari, coordenador técnico da entidade, esteve na redação e relembrou a luta pela despoluição.

Segundo ele, no ano de 1995 o então governador de São Paulo, Mário Covas (PSDB), exigiu de sua equipe a realização de uma audiência pública na cidade de Tietê para discutir a questão do destino do lixo produzido na Grande São Paulo que era lançado nos rios Tietê e Pinheiros e que ao final chegava até as cidades do Médio Tietê.

Após discussões ficou aprovado pelas autoridades um acordo entre o Governo do Estado e prefeitos do Médio Tietê. O ajuste estabelecia que ao Governo cabia a responsabilidade da contenção e retirada do lixo sobrenadante nas águas dos rios. O serviço seria realizado mediante a instalação de barreiras em diversas seções dos rios Tietê e Pinheiros. A meta era impedir a transferência dos resíduos para o Médio Tietê. 

O Governo Covas desenvolvia estudos para implantação de barreiras de lixo, as quais deveriam ser posicionadas ao montante de barragens existentes dentro da cidade de São Paulo. Mas, logo após o falecimento de Mário Covas, os projetos não prosseguiram, de modo que o “Acordo de Tietê” ficou esquecido pelos governantes que o sucederam.

Desde então, as cidades da região continuaram a suportar prejuízos referentes à saúde pública, economia e inclusive para o turismo e lazer da população, decorrentes do acúmulo do lixo no Tietê recebido da capital.

Ações

Atualmente, ações são promovidas pelas autoridades regionais para a causa do Tietê. Em função dos últimos registros de dejetos e poluição das águas, a Prefeitura de Salto, por meio da Secretaria Municipal de Meio Ambiente, criou um minucioso relatório, e o encaminhou à CETESB e ao Governo Estadual, solicitando imediatas providências.

Além disso, por solicitação do prefeito Laerte Sonsin (PL) e do vice-prefeito Edemilson Santos (Podemos), uma Comissão de Trabalho do Interior foi criada para atuar exclusivamente em prol da despoluição do Rio Tietê.

Sonsin assumiu, no início do ano, a presidência do Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio Sorocaba e Médio Tietê (CBH – SMT), constituído por mais de 35 cidades, órgãos do estado e representantes da sociedade civil organizada, e que tem contribuído para a recuperação e fortalecimento do sistema estadual de recursos hídricos.

Já pelos lados de Itu, o prefeito Guilherme Gazzola (PL), que é Diretor-Presidente da Fundação Agência da Bacia Hidrográfica do Rio Sorocaba e Médio Tietê, informou que está encabeçando a elaboração de um projeto que visa a despoluição do trecho de Guarulhos jusante à Itu. O levantamento deverá apontar todos os municípios que lançam esgoto no Rio Tietê, assim como indicar as cidades que não promovem o tratamento de esgoto.

A etapa seguinte será o emprego deste estudo na criação de um cronograma para a cobrança de providências por parte dos municípios em questão em relação à despoluição das águas. A iniciativa foi aprovada em plenária da última reunião do CBH – SMT e mostra-se prioritária neste cenário da pior crise hídrica dos últimos 90 anos. O projeto está em fase de produção de documentação técnica.

Além disso, a Secretaria Municipal de Meio Ambiente apresentará ao Governo do Estado um projeto de revitalização da Estrada Parque, visando a valorização do Rio Tietê. Nesta semana, juntamente com a deputada estadual Maria Lúcia Amary (PSDB) e a secretária de Meio Ambiente e Recursos Hídricos de Itu, Verônica Sabatino, Gazzola esteve em reunião no Governo do Estado apresentando o projeto ao secretário Estadual de Infraestrutura, Marcos Penido. As cidades de Itu e Salto realizam, também atividades referentes ao Rio Tietê na Semana da Árvore. Acompanhe a programação no site do JP.

Barreiras ecológicas instaladas no Tietê são debatidas

Recentemente, Salto foi escolhida para receber uma iniciativa inédita que visa tentar conter e monitorar a quantidade de lixo despejada no Rio Tietê. Em agosto, foram instaladas barreiras ecológicas no Parque de Lavras, que ficaram atravessadas no rio e deveriam impedir a chegada de materiais recicláveis para conter o avanço da poluição.

As barreiras fazem parte da ação “Rios Sem Plásticos”, da ONG SOS Mata Atlântica em parceria com a empresa Ypê. Porém, pouco tempo após a instalação das mesmas, elas se romperam devido à lama química que desceu pelo rio no dia 28 de agosto.

As “eco-barreiras” são alvo de críticas por parte do INEVAT. Através de uma nota de repúdio, a entidade afirma que instalações desse tipo de barreira “são medidas de marketing pirotécnico porque simulam retirar a totalidade do lixo”.

“Pura enganação, uma vez que não impedem a passagem de resíduos emersos, principalmente plásticos, assim como ondas de espumas de sabões que cobrem o Tietê”, declara a nota, afirmando ainda que as barreiras não contam com Relatório de Impacto Ambiental e Licença de Instalação.

“O empreendimento da SOS Mata Atlântica, fora da Região Metropolitana de São Paulo, torna claro o objetivo da entidade de enterrar o Acordo de Tietê de 1995 e, desta forma, consolidar o processo de transferência do lixo descartado na Região Metropolitana para as cidades ribeirinhas do Médio Tietê”, aponta a nota.

A reportagem do JP entrou em contato Malu Ribeiro, jornalista, ambientalista e diretora de políticas públicas da Fundação SOS Mata Atlântica, para saber mais a respeito das barreiras. Segundo ela, o projeto busca “sensibilizar a sociedade e buscar soluções efetivas para o problema dos resíduos sólidos flutuantes, geralmente materiais recicláveis, que são descartados de forma inadequada e vão parar nos rios”.

As barreiras visam retirar o que for possível, classificar, separar e destinar para reciclagem ou aterro. “Ao identificar as empresas que geram esses resíduos, teremos condições de promover uma ação de mobilização e políticas públicas para aplicação da responsabilidade pós-consumo. É um estudo e também uma iniciativa educativa e de mobilização social”, conta Malu.

Ainda de acordo com ela, a “eco-barreira” não gera impacto na vazão da água, nem nas áreas de preservação permanente. “Apesar disso, evidentemente que como organização ambientalista que atua na defesa da Mata Atlântica e dos rios, solicitamos licença à CETESB e aos órgãos competentes”, completa Malu.