Vitória do povo contra o vale tudo do Governo

Por João Badari*

 

A desistência oficial da votação da reforma da Previdência em 2018, pela equipe econômica do Governo Michel Temer, é uma vitória do povo, dos trabalhadores. Nem o vale tudo, com a promessa de bilhões para comprar o voto de deputados e senadores, e nem o pânico que o Governo Federal instalou no país, com propagandas sistemáticas sobre o mito do déficit da Previdência Social no país, foram capazes de garantir a aprovação do texto da proposta que representaria um grande retrocesso social para os segurados do INSS.

Uma vitória que deve ser comemorada, mas com uma certa cautela. Isso porque a reforma da Previdência não será votada momentaneamente no Congresso Nacional por três fatores: o ano de eleição presidencial, a falta de força política para aprovação da reforma em ano eleitoral e o impedimento constitucional, por conta da intervenção federal no Rio de Janeiro, que atravessa um caos, principalmente na segurança pública. Isso indica que a votação está suspensa, mas não arquivada. Logicamente, o Governo Federal entregou os pontos e “jogou a toalha” no último round desta batalha. Mas a revanche pode ser anunciada em breve. Assim, precisamos continuar em alerta contra os possíveis passos e ataques da equipe econômica do Governo Federal na área previdenciária.

E a vitória também teve um sabor amargo. Na caminhada pela aprovação da reforma da Previdência, a equipe de Temer conseguiu ampliar o prejuízo nos cofres da Previdência Social em várias frentes. A pior de todas foi com a corrida dos trabalhadores para se aposentar. O alarde com a possibilidade da aprovação de uma nova idade mínima de 65 anos para homens e 62 anos para mulheres, além de 40 anos de contribuição mínima para garantir o benefício integral de aposentadoria, fez com que milhares de segurados do INSS se aposentassem de forma precipitada.

O reflexo direto desse efeito negativo teve dois lados trágicos. O primeiro é que muitos brasileiros se aposentaram com um valor de benefício inferior do que poderia conquistar se seguisse um planejamento para atingir regras mais favoráveis. A maioria das pessoas certamente não atingiram a Fórmula 85/95, que garante o benefício integral para as mulheres que somassem 85 pontos e homens que chegassem aos 95 anos, na soma da idade e do tempo de contribuição à Previdência. E, assim, tiveram seu benefício reduzido pelo fator previdenciário, que em muitos casos chega a reduzir cerca de 30% no valor da aposentadoria.

E o segundo, de acordo com dados recentes, por conta dessa corrida provocada pelo pânico da reforma, a Previdência Social teve um gasto imediato de mais R$ 1,8 bilhão com as novas aposentadorias. O crescimento em 2017 foi de 47% nos pedidos de aposentadoria, em relação aos períodos passados. Entre 2015 e 2017, as concessões passaram de 318,5 mil para 468,5 mil aposentadorias. Antes da discussão da reforma, esse crescimento era de cera de 2% ao ano.

Além disso, o Governo Federal gastou cerca de R$ 93 milhões em propagandas para tentar explicar e tentar convencer a população sobre a necessidade da reforma. Outro tiro no pé que custou muito caro. Sem contar o desgaste político, social e de imagem do presidente, que peregrinou pelos principais meios de comunicação brasileiros para defender as mudanças previdenciárias, que atingiam apenas os trabalhadores e manteriam os privilégios da classe política e dos militares. Dinheiro e tempo que poderiam ser gastos em áreas bem mais necessitadas, como a saúde, a segurança e a educação.

E, apesar da vitória na questão previdenciária, não podemos esquecer o duro golpe sofrido pela população com a aprovação da reforma trabalhista, que precarizou direitos, incentivando a informalidade e a “pejotização”. E, assim, refletindo na queda de contribuições ao INSS.

O Palácio do Planalto sustenta o discurso de que a reforma só não será votada porque há segurança jurídica para revogar o decreto de intervenção federal no Rio de Janeiro, que impede a votação de uma PEC (Proposta de Emenda à Constituição). Porém, a verdade é que a força do povo garantiu com que nem as benesses bilionárias oferecidas pelo presidente e nem o discurso vazio do suposto déficit fossem suficientes para garantir que reforma fosse aprovada.

 

*João Badari é advogado especialista em Direito Previdenciário e sócio do escritório AIth, Badari e Luchin Advogados