ZICO, O RANZINZA

O Bar e Café Expresso reinou em Itu por décadas. Servia de tudo: lanches, café, cerveja, cachaça, doces, almoço, janta, cigarros. Não era um lugar de luxo, mas vivia lotado de pessoas das mais variadas classes sociais. Ficava bem ali na 7 de Setembro no quarteirão da Floriano Peixoto com a Santa Rita. Quando falo que era frequentado por pessoas de todas classes sociais, deveria falar de “homens de várias classes sociais” pois eram raras as mulheres que frequentavam o estabelecimento. O bar ficava a menos de 100 metros de outro bar famoso, o São João, que ficava no mesmo quarteirão, só que do outro lado da rua. Interessante é que tanto o Expresso como o São João eram de famílias com sobrenome Scalet. O São João era do Felício Scalet e o Café Expresso dos irmãos Divaldo e Ademir…Scalet, lógico.

Os irmãos Scalet, tinham dois balconistas que se revezavam: o Zé e o Zico. O Zé era um cara normal, mas o Zico tinha todo um comportamento diferente com a freguesia. Vivia provocando a todos e era provocado por todos, diuturnamente. Quando algum freguês reclamava do atendimento, Zico não deixava barato, reagindo: “Vá no bar de cima e não encha o saco”. Na hora do apuro, quando havia muitos freguezes, alguns destes se ofereciam para atender o balcão. Um deles era o Sargento Dionísio, saudoso e sarrista. O freguês chegava, olhava a vitrine e apontava um doce. Dionísio ia, pegava o doce COM A MÃO, colocava no pegador metálico e entregava. Já sabia que Zico iria expulsá-lo para fora do balcão, mas a graça estava aí: irritar o balconista oficial. O ex-goleiro inesquecível, Zé Calango não era de beber, mas era um sarrista. Chegou um dia e pediu ao Zico, um metro de cachaça. Zico deve ter pensado: “agora eu pego esse traste”. Pegou o litro e foi despejando caprichadamente ao longo do balcão, até parecer um metro. Olhou para o Zé com cara de gozação e disse: “Ta aí a sua cachaça”. Zé Calango que já esperava por isso, foi ordenando: – “Agora embrulhe que vou levar pra casa!” Assim, cada dia que passava o Zico ia querendo se aposentar e largar o balcão.

Naqueles tempos o chamado Largo do Mercado fervia de gente, principalmente porque os ônibus intermunicipais tinham ali o seu ponto de partida, e ainda não havia estação rodoviária. O lugar parecia um mercado persa. Tinha mágicos que apresentavam cobras, violeiros amadores, vendedores de remédios milagrosos, pregadores evangélicos e até mesmo um sanfoneiro que tocava na porta do mercado, com o chapéu no chão para ganhar umas moedas. Certo dia, levaram ele até o Café Expresso e mal ele chegou no balcão e Zico foi perguntando com certa ironia: – “Em que posso servir o cavalheiro?” O sanfoneiro pediu um copo de vinho. Zico, que não estava de bom humor retrucou: – “Diga logo. Vinho tinto ou branco?” e o freguês: – “Tanto faz, eu sou cego mesmo”. Ao invés de servir o sanfoneiro, Zico tirou o avental e saiu direto até a sede do INPS. Foi solicitar a aposentadoria…