Especial: a relação de Ayrton Senna com a cidade de Itu

Tricampeão de Fórmula 1 visitou a cidade algumas vezes. Até hoje, ituanos mantêm idolatria ao grande ídolo do esporte brasileiro (Foto: Reprodução)

Há exatos 30 anos, no dia 1º de maio de 1994, o mundo do automobilismo chorava a morte de Ayrton Senna. O piloto brasileiro,  tricampeão mundial de Fórmula 1, faleceu após se acidentar durante a 7ª volta do GP de San Marino, disputado no Autódromo Enzo e Dino Ferrari, em Ímola.

Falar sobre os feitos de Senna é “chover no molhado”, porém, nunca é demais falar sobre o “eterno campeão”. Nesta edição, o Periscópio traz histórias que, de alguma forma, ligam Ayrton à cidade de Itu.

Em diversas oportunidades, Senna esteve no município ituano. De acordo com o empresário Herbert Steiner, proprietário do Bar do Alemão, o piloto esteve no estabelecimento quando atuava pela equipe Lotus [entre 1985 e 1987], período em que ainda sonhava com um título mundial.

“Ele namorava uma moça [Adriane Yamin] que a família tinha uma fazenda aqui na região, então, por diversas vezes, ele esteve por aqui. Temos até uma foto dele colocada aqui no restaurante”, orgulha-se Herbert, que comenta ainda que Ayrton costumava ir almoçar e jantar ali com a família da namorada. 

“Ele era bastante simpático”, diz o empresário, que recorda ainda da morte de Senna. “Ele era o ídolo nosso.Todo mundo parava tudo para assistir as corridas dele. Quando ele faleceu, eu estava cuidando da alimentação do Kartódromo da Schincariol. E eu estava almoçando com o [José] Nelson Schincariol [empresário, já falecido, proprietário da antiga cervejaria Schincariol], quando soube da notícia a levei para o Nelson e ele até chorou”.

Ex-namorada

O JP também conversou com Adriane Yamin, ex-namorada de Ayrton Senna. Ambos namoraram entre 1985 e 1988. À reportagem, ela – que é autora da biografia “Minha Garota”, em que aborda o seu relacionamento com o tricampeão mundial – comenta que, além do Bar do Alemão, eles frequentavam a Max Pizzaria, também em Itu.

Adriane Yamin visitava a cidade de Itu com frequência, juntamente com Ayrton Senna (Foto: Arquivo/Adriane Yamin)

Adriane e sua família possuem uma fazenda próxima a Porto Feliz e ela comenta que desde os 13 anos vem para Itu [atualmente ela tem 54 anos].“Acabamos por conhecer alguns moradores ilustres”, recorda.

“Quando começamos a frequentar juntos [a cidade de Itu], o Senna não era tão famoso, mas com o passar dos anos, infelizmente ficou impossível ir a Itu”, explica Adriane que comentou ainda que o assédio dos fãs só fez aumentar.

“Sempre que ele estava no Brasil, ele estava conosco em nossa propriedade aí próximo a Itu. Foi onde ele, junto ao meu falecido cunhado Eduardo Abdelnur, iniciaram a paixão pelo aeromodelismo. Era pura diversão nos dias que passávamos por aí. O que me restou foi uma saudade imensa daqueles tempos tão bons”, prossegue Adriane.

A empresária destaca que Senna era exatamente o que aparentava. “Um cara dedicado, competitivo, mas ao mesmo tempo generoso, cuidadoso e amoroso. Ele também era um filho muito querido e amado. Ele só tinha qualidades e era impossível para mim não amá-lo loucamente, assim como os fãs dele o amam até hoje”. Adriane lançou a biografia “Minha Garota” em 2019, após oito anos de produção. O livro pode ser adquirido através do link https://bit.ly/3Qo8jFV.

Transmissões

Locutor esportivo com passagem pela Rádio Convenção de Itu, entre 1978 e 1982, Nilson César, pela Jovem Pan [rádio em que permanece até hoje], narrou mais de 200 GPs de Fórmula 1 em sua carreira e, entre 1986 e 1994, foi o responsável por ser a voz da emissora nos três títulos mundiais de Senna (1988, 1990 e 1991) e também na corrida em que faleceu.

Nilson César entrevistando Ayrton Senna, minutos após o piloto conquistar seu primeiro título mundial, em 1988 (Foto: Arquivo/Nilson César)

Ao JP, Nilson comenta como foi narrar a última corrida de Senna. “Narrar o Grande Prêmio de San Marino de 94 foi muito triste, pois registramos ali duas mortes. No sábado, no treino, a do [Roland] Ratzenberger [da equipe Simtek] e a do Ayrton [que corria pela Williams] no domingo. Você narrar a morte de um ídolo tão grande para nosso país – para mim, depois do Pelé, foi o esportista mais importante do Brasil – é algo muito triste. Foi marcante”.

“Se eu tivesse que apagar da trajetória da minha vida aquele fim de semana para que nada daquilo tivesse acontecido, eu apagaria facilmente. As lembranças daquele final de semana são pesadas, são tenebrosas. Porque naquele final de semana você teve o acidente do Rubinho Barrichello [Jordan] logo na sexta-feira, depois o acidente fatal do Ratzenberger no sábado e a morte do Ayrton no domingo. Aquele final de semana foi doloroso para todos nós. O clima no autódromo estava pesado demais. Foi frustrante”, diz o narrador.

Nilson destaca que acompanhar a trajetória de Ayrton foi um fator decisivo dentro da sua ascensão profissional. “Porque a cada semana eu estava em uma parte do mundo, em um país diferente, convivendo com culturas diferentes, povos diferentes. Foi algo espetacular. Eu acho que eu tive uma grande ascensão profissional acompanhando toda a trajetória do Ayrton. Estávamos lado a lado em todas as partes do mundo. Significou muito”.

O narrador diz só ter boas lembranças de Senna. “Um cara focado, centrado, equilibrado, que abdicou de muita coisa na vida dele para se tornar campeão do mundo de Fórmula 1. As grandes paixões dele eram as corridas. A grande obsessão era ganhar um campeonato mundial e acabou ganhando três vezes. Sempre fui muito bem tratado por ele e sempre o tratei muito bem também”.

Nilson acredita que se não tivesse morrido naquele 1º de maio de 1994, Senna teria sido campeão mais vezes na Fórmula 1. “Eu tenho certeza que ele ganharia mais títulos. Não fosse sua morte prematura, ele ganharia mais dois, três títulos. Ele morreu muito cedo, com 34 anos de idade. O Ayrton não entrava numa pista para ser perdedor. Em 94 ele foi pole position nas três corridas [que disputou]. Ele era um cara que nasceu para ser vencedor”.

GP do Brasil

Em 24 de março de 1991, Ayrton Senna venceu pela primeira vez o GP do Brasil, disputado no Autódromo de Interlagos. Até então bicampeão mundial, faltava para Senna uma vitória “em casa” e ela foi conquistada de maneira dramática, já que nas voltas finais sua McLaren apresentou problemas e com apenas uma marcha em seu bólido, conseguiu segurar as investidas de Riccardo Patrese [Williams] para triunfar.

Wilton Sturm até hoje guarda o ingresso e camiseta do GP do Brasil de 1991. Lembranças de uma corrida histórica (Foto: Daniel Nápoli)

O professor Wilton Sturm, morador de Itu, era um dos milhares presentes naquele dia em Interlagos. “Fui aos treinos e fui à corrida com meu irmão e um amigo. Foi a maior fila que peguei na minha vida. Tinha 2 km de fila, mas valeu demais. Estava vendo a história sendo feita. Quem estava na arquibancada, não sabia que ele estava com problemas do carro, então pra gente não houve aquele ‘drama’”.

O GP do Brasil de 1991 foi o primeiro em que Wilton foi a um autódromo e ele relata que foi com o olhar de querer ver todos os detalhes. “Enquanto a maioria queria ver os três primeiros [da prova] ou os brasileiros, eu observava o todo. Se fosse o Senna ou outro piloto, não me importava, o importante era estar lá, sentindo tudo aquilo, queria ver o evento, com certo afastamento”, recorda.

“Senna em duas rodas”

A Ducati 916 foi a primeira moto a ganhar uma série especial do Ayrton Senna, apresentada em 1994, durante o Bologna Motor Show, na Itália. Mais do que uma linda homenagem ao piloto brasileiro, o modelo continha modificações sugeridas pelo próprio Senna a Claudio Castiglioni, que era seu amigo pessoal e, na época, comandava a Ducati.

Rogério Cunha juntamente com a motocicleta Panigale S Senna: realização de um sonho (Foto: Daniel Nápoli)

Foram lançadas 301 unidades com peças em fibra de carbono para tornar a moto mais leve e até o tom de cinza escuro em contraste com as chamativas rodas cor de abóbora. 

Em 2014, para marcar os 20 anos da morte de Ayrton, a Ducati criou a superesportiva 1199 Panigale S Senna, que foi comercializada apenas no Brasil. Limitada a 161 exemplares (o número de GPs de Ayrton na F1), a moto teve parte da renda revertida aos projetos educacionais do Instituto Ayrton Senna.

Dos 161 exemplares produzidos, um deles, o “80”, está na cidade de Itu. O empresário Rogério Cunha é o proprietário da moto. Amante da velocidade, já tendo sido campeão sob duas rodas, o morador de Itu é fanático por Ayrton Senna. 

“Eu, como fã, sempre quis ter um objeto. Sou fã dele não só como esportista, mas como homem, como personalidade e quando eu vi essa moto em 1996 eu cheguei até a chorar e dizia que meu sonho era ter essa moto. No fim de 2014 (quando foi relançada) deu certo e por felicidade eu consegui a número 80, que é exatamente o número de pódios que o Senna conquistou na Fórmula 1. Para mim é um troféu, não tem preço”, explica Cunha.

O empresário, que possui uma coleção de jornais, revistas e livros sobre Senna, comenta ainda que a moto tem um pedigree de autódromo e, por isso, fez um curso de pilotagem para utilizá-la em pista. “Foi quando corri em Interlagos com ela, a emoção aflorou”.

“Ituano” em Ímola

No Autódromo Enzo e Dino Ferrari, foi feito um memorial para Ayrton Senna. No local, há uma estátua de bronze do piloto em que, todos os anos, milhares de fãs de todas as partes do mundo realizam orações, deixam bandeiras e mensagens em homenagem ao tricampeão.

Marcelo Sampaio exibindo a bandeira do Ituano Futebol Clube que confeccionou em homenagem a Ayrton Senna (Foto: Arquivo/Marcelo Sampaio)

O ituano Marcelo Sampaio, conhecido por ser colecionador de camisas de futebol e ter um rico acervo relacionado ao Ituano Futebol Clube, também é fã de Ayrton Senna e possui diversos itens relacionados ao piloto.

Ao se deparar com um vídeo do videomaker João Bramatti, que participava do evento Senna Day, em 1º de maio de 2019, Marcelo passou a alimentar um sonho. “Pensei: ‘já pensou que legal um dia poder mandar pra lá uma bandeira do Ituano?”. Lá tem a bandeira de todo o mundo. Veio a pandemia e no ano passado apareceu de novo um vídeo dele”.

Foi então que o desejo reacendeu e o colecionador entrou em contato com João. “Perguntei se havia a possibilidade de ele levar a bandeira lá pra mim e ele falou que sim. Fiz a bandeira, mandei pra ele por correio e ele colocou pra mim lá no memorial do Senna”.

João Bramatti, no Memorial em Ímola, com a bandeira confeccionada por Marcelo Sampaio (Foto: Arquivo/João Bramatti)

João Bramatti, que trabalha com pilotos como Pietro e Enzo Fittipaldi, produz vídeos oficiais do Autódromo Enzo e Dino Ferrari e possui um canal sobre automobilismo no YouTube, nasceu em Cascavel (PR) e até agosto do ano passado morava na Itália, a uma distância de 40 minutos do autódromo.

Atualmente morando na Flórida (EUA), ele comenta com emoção a oportunidade de ter levado a bandeira do Ituano, a pedido de Marcelo, ao memorial. “Muito legal poder representar não só o Ituano, a cidade de Itu, mas representar todo mundo que viu os vídeos. Foi como se estivesse representando todo mundo que assistiu, foi uma experiência muito boa pra mim”.

O vídeo de João exibindo a bandeira do Ituano, que conta com o rosto de Ayrton Senna nela, pode ser conferido no canal de Bramatti, através do link https://bit.ly/3wnAJJf.

Legado

Mesmo três décadas após sua morte, Senna segue vivo na memória dos fãs de todo o mundo. O fanatismo pelo tricampeão mundial atravessou gerações. A marca de Ayrton é tão forte que ele possui fãs que nasceram depois de seu falecimento.

Entre eles, está a jornalista ituana Beatriz Pires. Nascida em 1997, ela herdou a idolatria pelo tricampeão. “A minha admiração pelo Senna já vem de família: desde quando eu era muito pequena, minha mãe sempre me contava como era acordar todo domingo de corrida e parar tudo para vê-lo brilhar nas pistas.”

Beatriz Pires em visita ao túmulo de Ayrton Senna, no Cemitério do Morumbi, em São Paulo (Foto: Daniel Nápoli)

“Apesar de ter nascido três anos após a sua morte, naturalmente passei a gostar de assistir às corridas de Fórmula 1, mesmo sem a presença dele, mas sempre me interessando muito pela sua história”, explica Beatriz.

Recentemente, Beatriz visitou, em São Paulo, a exposição “Nosso Senna Collection”, com obras da artista multiplataforma Lalalli Senna, sobrinha de Ayrton. A mostra ocorreu no showroom da McLaren São Paulo. E, também na capital paulista, a ituana esteve no Cemitério do Morumbi, visitando o túmulo do tricampeão. “Visitar o túmulo do Senna foi muito emocionante e me fez refletir sobre muitas coisas, especialmente sobre a importância da preservação da memória”.

Showroom da McLaren São Paulo, foi palco da exposição “Nosso Senna Collection”, entre os meses de março e abril (Foto: Daniel Nápoli)

Sobre a exposição “Nosso Senna Collection”, que conta com bustos do tricampeão, Lalalli Senna comentou sobre o processo de produção.“Foi uma experiência inexplicável. Em um certo momento da modelagem, foi como ter o próprio Ayrton olhando para mim. Como se eu estivesse revendo o ‘Becão’ pela primeira vez, exatamente como na última vez em que o vi”, diz a artista.

Títulos: 3 (1988, 1990 e 1991)
Vitórias: 41
Poles positions: 65
Pódios: 80
Equipes: 4 (Toleman – 1984, Lotus – 1985 a 1987, McLaren – 1988 a 1993 e Williams – 1994)
Recordes: Ayrton Senna ainda possui alguns recordes na Fórmula 1: piloto com mais vitórias no GP de Mônaco (6 – 1987, 1989, 1990, 1991, 1992 e 1993); piloto com mais pole positions consecutivas na história da categoria (8, entre 1988 e 1989) e piloto com mais pole positions (46), vitórias (35) e títulos pela McLaren (3).

2 comentários em “Especial: a relação de Ayrton Senna com a cidade de Itu

  • 01/05/2024 em 14:58
    Permalink

    Uma das melhores reportagens sobre Senna, que tive oportunidade em ler hoje. Parabéns à toda equipe do Periscópio. E principalmente à Adriane por ter compartilhado comigo.

  • 08/05/2024 em 20:56
    Permalink

    Parabéns Daniel Nápoli pela excelente matéria… Sem dúvida, umas das melhores que li nos últimos tempos sobre nosso ídolo. Muita coisa, eu não sabia, mesmo me considerando grande admirador do nosso eterno Senna.

Os comentários estão desativados.