Quando a prevenção não é o melhor remédio
Estudante de estética, a jovem Fabiana Bassi, de 18 anos, foi diagnosticada com trombose cerebral causada pelo uso da famosa pílula
Ana Luísa Tomba
Alguns casos de trombose associados ao uso de anticoncepcionais tiveram mais evidência nos últimos meses, através de depoimentos divulgados nas redes sociais. Foi o caso da estudante de Estética Fabiana Bassi, de 18 anos.
A última terça-feira do mês de agosto, dia 30, não está nas lembranças de Fabiana. Segundo a mãe dela, Silvia Bassi, ao acordar a menina pela manhã, percebeu que ela não se portou normalmente. “Eu fui ao quarto dela acordá-la e ela já estava diferente… Ela estava aqui e não estava. Estava acordada, mas acho que a mente dela não, porque eu falava com ela e ela demorava para responder. A Fabi chegou até a vomitar nela mesma. E ela não lembra de nada disso. Lá no hospital, ela não sabia nem fazer xixi. Ela estava ali, mas acho que a mente dela já não estava mais”, explicou a mãe, ainda se recuperando do susto.
Fabiana começou a tomar a pílula há sete meses, quando percebeu um aumento anormal no fluxo menstrual. Preocupada com a possibilidade de ser algo mais sério, procurou um ginecologista. O médico a receitou um remédio para normalizar o fluxo e a pílula para manter regular.
Desde então, Fabiana vinha tendo dores de cabeça e em outras partes do corpo com uma intensidade maior. “Na perna eu não sentia tanta dor. Mas como eu já tinha quebrado o dedinho do pé, eu achei que a dor era disso, de ficar forçando. Só que no fim, não era. E eu estava sentindo muita, mas muita dor no braço direito. Fui ao ortopedista e ele disse que era tendinite. A dor era tanta que não conseguia nem levantar o braço, nem escrever. Não conseguia nem dormir do lado direito, de tanta dor. Depois, a dor passou. Agora eu durmo só do lado direito!”.
O diagnóstico
Uma semana antes de ser internada, Fabiana já havia parado de ir às aulas, porque as dores de cabeça estavam extremamente fortes. “Eu não conseguia ficar em ambientes com as luzes acesas. Já não saía do quarto, e lá eu mantinha as luzes apagadas o tempo todo. Nem no celular eu conseguia mexer. Só queria ficar deitada. Minha mãe me levou ao Pronto Atendimento três vezes no mesmo dia, mas os exames só constavam uma sinusite, e nós estávamos tratando como se fosse só uma sinusite”, conta a jovem.
No dia 30 de agosto, Silvia Bassi levou a filha imediatamente ao hospital. Após um exame, o médico confirmou o diagnóstico de trombose cerebral. Ao longo do dia, Fabiana ia perdendo os movimentos do braço e da perna direitos, e já não falava mais. Assim, foi internada na UTI, para que o tratamento com anticoagulantes começasse imediatamente.
Após dois dias, Fabiana foi acordada pela enfermeira, mas, segundo ela, não se recorda dessa data. Só pôde reagir melhor no dia seguinte. “Na sexta-feira, acordei melhor. Perguntei à minha mãe o que tinha acontecido. Eu não tinha entendido muito bem o que eu estava fazendo ali. Fui entendendo aos poucos, mas não sabia que era algo tão grave. Fiquei sabendo depois que se esperassem o dia seguinte, não daria tempo de socorrer e eu teria morrido”, conta Fabiana.
Para a surpresa do médico e alegria da família da menina, a evolução de Fabiana era rápida, e, no sábado, já pôde deixar a UTI. Depois de mais alguns dias em observação, deixou o hospital. “Graças aos médicos, deu tudo certo. A Fabi foi socorrida depressa. Porque não foi fácil. Foi um choque muito grande”, lembra a avó de Fabiana, Onélia Bassi.
Recuperação
Mesmo depois de duas semanas, Fabiana continua faltando às aulas, porque a recuperação é delicada, já que a trombose se deu no cérebro. Ainda sonolenta, ela evita ficar muito tempo de pé, mas continua o tratamento para voltar com a coordenação motora. “Agora estou fazendo sessões de fisioterapia. Como eu perdi os movimentos de uma perna e de um braço, preciso refazer o fortalecimento para que volte ao normal. Ainda não consigo escrever direito, por exemplo. Na perna, eu sinto um pouco de fraqueza, só que aos poucos o movimento e a força vão voltando”, conta Fabiana, sempre confiante.
Redes sociais
Foi através do Facebook que Fabiana Bassi resolveu divulgar o que aconteceu, e, justamente pelo Facebook, a menina soube de um caso igual ao dela, em Goiânia. Foi aí que decidiu parar de tomar anticoncepcional. “Eu já ia parar de tomar porque estava com medo desse acidente com a menina. Essa cartelinha que estava tomando era a última. Faltaram dois comprimidos para terminar. Aí que aconteceu tudo isso comigo antes mesmo de eu parar”, disse a menina.
Questionada sobre o motivo da divulgação pela rede social, Fabiana explicou que o principal objetivo era alertar mais meninas. “Não é só a marca que eu tomei, qualquer uma pode fazer isso. Porque, às vezes, você vê um caso lá de longe, como foi o de Goiânia, e nunca acha que vai acontecer com você, então continua tomando. Aí, pensei que, por eu morar perto, poderia chamar atenção dessas meninas daqui da região, que moram perto também, para que elas parem de tomar a pílula”.
Palavra do médico
O ginecologista Hélcio Barbosa Nascimento explica que a trombose “é quando o sangue coagula dentro do vaso sanguíneo e forma um trombo, que é um coágulo. Esse coágulo pode se deslocar do lugar onde foi formado e acabar entupindo outro vaso mais distante”, resume.
A relação do anticoncepcional com a trombose é mais simples do que se parece. “O anticoncepcional é remédio, e não existe nenhum remédio que não tenha nenhum efeito indesejado. No entanto, a pílula, em algumas mulheres, aumenta a velocidade de coagulação do sangue. Por isso há possibilidade de efeitos colaterais”.
O ginecologista alerta que há pessoas com mais propensões aos efeitos colaterais da pílula. “Mulheres que fumam, que têm varizes, que já tiveram casos de inflamação nas veias e que são diabéticas não devem tomar anticoncepcional”. Para as mulheres se tranquilizarem quanto à possibilidade de casos como o de Fabiana, Dr. Hélcio recomenda um exame de sangue para ver como está o sistema de coagulação.
“O anticoncepcional, o controle da própria fertilidade, foi a grande conquista da mulher moderna, mas não significa que não tenha riscos. E hoje há outras formas de prevenir uma gravidez indesejada”, comenta o especialista.
O outro lado
Fabiana, otimista, consegue enxergar o lado bom de tudo que aconteceu com ela. “Agora que eu passei por isso, percebo que é preciso prevenir a gravidez de outras formas, mas dessa forma não. Saber que eu poderia ter morrido é uma reflexão gigantesca. Parece que agora tudo é bonito para mim. Até umas coisas aleatórias, eu vejo e acho lindo! Aprendi a dar mais valor para as coisas, a vida é muito diferente agora. É sinistro pensar que não era mais para eu estar aqui”, reflete a menina.