O problema do Brasil não é a carne: é a corrupção

Mariele Previdi Pedroso*
Há uma semana, o Brasil e o mundo foram surpreendidos pela Operação Carne Fraca, deflagrada pela Polícia Federal. Os efeitos foram imediatos: informações desencontradas, pânico na população, que passou a questionar a qualidade de toda a carne comercializada no País, redes sociais em polvorosa com o assunto. Até o momento, 18 países já apresentaram algum grau de restrição à carne brasileira. Os embarques diários caíram vertiginosamente: de US$ 63 milhões para US$ 74 mil, segundo levantamento do Ministério da Indústria, Comércio Exterior e Serviços (Mdic).

O que pensar diante disso tudo? Primeiramente, como disse o Ministro da Agricultura, Blairo Maggi, é preciso distinguir o “joio do trigo”. O Brasil tem 4.837 unidades de processamento animal. Em 21 foram encontradas algum tipo de irregularidade. O Ministério da Agricultura tem 11 mil servidores e apenas 33 são citados pela PF por desvio de conduta. São denúncias graves que precisam ser apuradas, pois envolvem questões de saúde pública. Mas de forma alguma comprometem o excelente padrão de qualidade das carnes brasileiras. A própria PF emitiu uma nota em conjunto com o Ministério da Agricultura afirmando: “Embora as investigações da Polícia Federal visem apurar irregularidades pontuais identificadas no Sistema de Inspeção Federal (SIF), tais fatos se relacionam diretamente a desvios de conduta profissional praticados por alguns servidores e não representam um mau funcionamento generalizado do sistema de integridade sanitária brasileiro”.

Corroboro essa confiança na carne brasileira com conhecimento de causa, pois trabalho com comunicação no agronegócio desde 2003, especialmente no setor de carnes – bovina, suína e de aves. Venho acompanhando de perto todo o esforço da cadeia produtiva nos últimos anos para melhorar a qualidade da carne que chega à mesa do consumidor. Produtores investindo em genética, manejo sanitário, nutricional e técnicas de bem-estar animal, indústria investindo em tecnologia para manter a qualidade que vem do campo, um diálogo cada vez mais maduro – ainda que difícil – entre os pecuaristas, avicultores e suinocultores com a indústria frigorífica. As empresas de insumos investindo em tecnologia para dar suporte a todo esse trabalho, pesquisadores fazendo estudos de ponta, eventos sendo realizados para levar essas informações e tecnologias Brasil afora, todo um esforço para abrir novos mercados para a carne brasileira e fortalecer mercados já conquistados. E sempre o desafio de tentar comunicar esse esforço para o consumidor.

O Brasil é o maior exportador de carne bovina do mundo, responde por 36% da exportação de frango e exporta carne suína para vários países. São mercados extremamente exigentes e que foram conquistados a duras penas, com muitos investimentos de toda a cadeia produtiva. Inúmeras auditorias são feitas periodicamente por esses países nas plantas produtivas de carne brasileira para a manutenção desse mercado e muitas vezes exigem o que nem mesmo eles fazem.

Por isso, foi extremamente prejudicial a forma pirotécnica como a Operação da Polícia Federal foi divulgada, com pouco parecer técnico (a ponto de a Associação Nacional dos Peritos Criminais Federais ter divulgado uma nota afirmando que as conclusões da Operação Carne Fraca referentes aos danos à saúde pública não têm embasamento científico, uma vez que os peritos federais foram acionados pela PF apenas uma vez durante as investigações e que o laudo resultante desse trabalho não comprovou tais danos), informações errôneas, como a suposta presença de papelão na carne (uma falha na interpretação dos áudios, pois os funcionários do frigorífico investigado se referiam à embalagem dos produtos) ou mesmo a presença de carne de cabeça de porco em embutidos, o que é permitido pela legislação.

Soma-se a isso a falta de aprofundamento – e por que não de responsabilidade? – dos veículos de comunicação em geral ao dar amplitude a essas desinformações, não consultando fontes técnicas e dando tons sensacionalistas à cobertura.

As denúncias de desvio de conduta de fiscais agropecuários e de profissionais dos frigoríficos são graves e precisam ser investigadas. Mas com responsabilidade! O grande problema do Brasil não é sua carne: é a corrupção. É a “carne fraca” de algumas pessoas que se corrompem, colocando em risco todo um setor extremamente importante para a economia do País, que traz divisas, gera empregos e, principalmente, é responsável por levar uma proteína de qualidade à alimentação de tanta gente no Brasil e no mundo.

 

* Mariele Previdi Pedroso é jornalista graduada pela PUC-Campinas, especialista em jornalismo econômico pela PUC-SP e diretora da Attuale Comunicação, empresa de assessoria de imprensa e produção de conteúdo especializada em agronegócios.