Eu também vou reclamar

Daniel Nápoli

 

O título deste artigo, que dá nome a uma de muitas célebres músicas de Raul Seixas (1945-1989), é pertinente ao cenário cultural da cidade de Itu. Há anos, em diferentes locais do município, ouço pessoas reclamando que “a cultura está morrendo por aqui” ou que “não há nada de bom para se fazer ou assistir em Itu”. Será mesmo?

Parte da população ituana que se diz amorosa ao município, que diz ser preocupada com o bem-estar de sua cidade, vive enaltecendo Salto, Indaiatuba e Cabreúva em sua cultura, enchendo o peito para falar que “nesses lugares, sim, os artistas e as prefeituras dão o devido valor à arte”.

Pois bem, ao mesmo tempo em que essas pessoas reclamam, em quase todos os finais de semana em Itu são apresentadas peças teatrais no Teatro Nósmesmos e, em frequência menor, mas relevante, no Temec, com uma presença de público que não condiz com a riqueza cultural existente na cidade e muito menos com o número de ituanos que clamam por opções do gênero.

Mas o mais interessante de tudo isso é que se as mesmas peças aqui em cartaz são encenadas em Salto, por exemplo. A Sala Palma de Ouro fica lotada e, curiosamente, 80% do público é ituano, por incrível que pareça. Se você quiser encontrar ituanos no teatro é mais fácil ir a Salto do que frequentar espaços em sua própria cidade. Mas por que isso ocorre? Por que a “grama do vizinho é mais verde do que a nossa”?

Isso infelizmente não ocorre só no teatro. Em Itu, além de ótimos atores e diretores, temos ótimos músicos, que também não recebem o devido valor. Temos o privilégio em nossa cidade de ter a centenária Banda União dos Artistas, que carece de uma atenção e de um carinho maior, assim como apoio financeiro, por exemplo. Porém, existem ituanos que preferem assistir a concertos de outras bandas de outras cidades, divulgando seus trabalhos e se esquecem da joia que tem em casa. Isso sem falar da tradicional Banda do Carmo, que se mantém a custo de muita luta e amor.

Mas esses mesmos reclamantes citam ainda que deixam de se interessar por produtos da cidade, pois não possuem investimentos. Mas será que não possuem investimentos porque autoridades não se interessam ou porque o público que poderia contribuir para tal sucesso não prestigia?

A Prefeitura de Itu vem realizando diversos eventos culturais, estimulando não só a presença dos ituanos como dos turistas, seja com apresentações das bandas na Praça da Matriz, seja com apresentações teatrais, dentre outras vertentes artísticas. Um trabalho louvável que é divulgado pela própria administração, nas redes sociais e pela imprensa. Com tantas opções de qualidade, fica difícil não reclamar dos “reclamões”. Todos têm o direito de reclamar, porém são necessários argumentos plausíveis.

Não sou o dono da verdade, nem estou dizendo que temos de ser “bairristas”, mas acredito que temos de colocar a mão na consciência e passar a olhar com mais atenção e mais carinho para os artistas da nossa cidade. Acompanhar, divulgar, valorizar seus trabalhos.

Caso contrário, com públicos cada vez menores em peças ou concertos, a tendência é que investimentos minguem e talentosos artistas ituanos acabem, por necessidade, partindo para outros municípios, em que a “grama do vizinho não seja mais verde” e sim aquilo que você tem de melhor e valoriza.

Outro fator importante a se destacar é que um lugar em que a cultura não é valorizada e pouco apreciada, fatalmente, é um espaço em que pouco se reflete, pouco se cria e pouco se desenvolve. Pensem nisso!