Periscópio Entrevista – Dr. Leonardo Bossi
Novembro é o mês de prevenção ao câncer de próstata, e a Campanha Novembro Azul foi criada com o intuito de conscientizar e informar os homens que, ainda hoje, sentem receio ou ficam presos aos tabus sobre o assunto. Nesta semana, conversamos com o Dr. Leonardo da Silveira Bossi, graduado em medicina pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), pós-graduado em pesquisa clínica pela Universidade de Harvard, mestre em oncologia avançada pela Universidade de Ulm (Alemanha) e diretor-presidente das clínicas NEO – ONCOLOGIA e Saúde Multidisciplinar, sobre o tema.
JP – A Campanha Novembro Azul é a campanha do mês de prevenção ao câncer de próstata. Como os homens devem e podem se prevenir?
O ideal é que os homens procurem um urologista ou oncologista para a avaliação inicial a partir dos 45 anos, anualmente. O toque retal é o exame mais adequado, e não o PSA (do sangue), como pensam muitos homens. A melhor prevenção é fazer o acompanhamento médico anualmente, nenhuma outra atitude é mais eficaz do que isso. Há muito questionamento sobre o que comer e hábitos de vida, mas o que se sabe com clareza é que hábitos de vida saudável, com exercícios regulares, é que fazem alguma diferença.
JP – Por que os homens têm receios e preconceitos quando se fala do câncer de próstata, ou melhor, dos métodos preventivos?
É difícil mensurar isso ou estabelecer um motivo específico, mas creio eu que muito tem a ver com nossa cultura latina, onde a masculinidade do homem é provada pelo seu desempenho sexual e o homossexualismo ainda é visto com muito preconceito, logo, por ser um exame na região anal, causa muita repulsa, especialmente nas camadas com menos cultura e educação escolar.
JP – Qual a importância da campanha preventiva? E quais os principais indícios de suspeitas de câncer de próstata?
As campanhas são cruciais para atacarem esse tabu social do toque retal, só mesmo tratando o assunto de forma natural vamos conseguir a penetração social dessa informação. O câncer de próstata é, via de regra, uma doença muito “silenciosa”, só causando sintomas em fases avançadas da doença quando já encontramos uma doença disseminada. Entretanto, alguns pacientes podem sentir incômodo, como sensação de retenção da urina ou maior esforço para urinar, mas são pouquíssimos os casos sintomáticos em fases precoces da doença, corroborando ainda mais a necessidade do acompanhamento médico anual.
JP – O câncer de próstata é pouco debatido. Você acha que isso é um fator resultante dos tabus da sociedade? Se sim, por quê?
Sim, com certeza. Acho que um pouco pelo que falei sobre nossa cultura latina e outro tanto pelo hábito, para mim meio sem sentido, de “não ficar procurando doença”, como se fosse isso que a causasse. Quando falamos de câncer então, esse medo é ainda mais forte.
JP – O câncer de próstata é a terceira principal causa de morte por câncer em homens. Você acha que esses números poderiam ser menores se a população debatesse mais sobre isso?
O câncer, de uma forma geral, tem uma incidência maior a partir dos 50 anos, com elevação progressiva. O câncer de próstata, em especial, tem uma evolução lenta quanto mais tarde ele surge e os pacientes conseguem viver bem por alguns anos, mesmo com a doença avançada, mas a ela não pára de evoluir e em algum momento sairá do controle caso o paciente sobreviva a outras doenças da terceira idade. O que mais nos preocupa, daí começarmos a procurar a doença tão cedo, é que a doença do homem com menos de 55, 60 anos geralmente é muito mais agressiva, com disseminação precoce e rapidez muito maior de crescimento. Esses pacientes poderiam fazer muita diferença na curva de sobrevida desse tumor, se forem diagnosticados o quanto antes. Os números são altos mesmo, de mortalidade, mas em termos percentuais o tumor de próstata mata muito menos que outros tumores. O terceiro lugar é porque é o tumor mais prevalente nos homens, portanto a população de doentes é muito maior.
JP – Qual pode ser a maior dúvida dos homens em relação ao câncer de próstata? E como é feito o diagnóstico da doença?
Acho que a maior dúvida é quanto ao tratamento. Muitos homens têm muito medo da quimioterapia ou acreditam que a cirurgia é mutilante ou que causa perda irreversível da potência sexual. Outros acham que a radioterapia “queima demais, queima tudo”. Tudo isso são tabus. A cirurgia evoluiu muito em suas técnicas nos últimos anos e a radioterapia também. A quimioterapia só se aplica em casos muito avançados da doença, quando os bloqueadores hormonais já não surtem mais efeito. Nos últimos anos, pela ineficácia da triagem feita pelo PSA, tem crescido a indicação da Vigilância Assistida (Active Surveillance) quando mais observamos a doença do necessariamente intervimos em sua evolução. Essa conduta foi tomada porque acredita-se que o número de pacientes que foram “sobretratados” (overtreatment), induzidos pela era do PSA, causou um número de mortes que anulou o número de pacientes que foram diagnosticados precocemente e curados pelo tratamento. O diagnóstico sempre é feito por meio de biópsia da próstata que é indicada pelo médico e nunca exclusivamente pelo PSA ou pelo receio puro do paciente.