Artigo: Em defesa do livre exercício da imprensa
Por Fernando José da Costa*
Começo essa escrita afirmando que o ideal de uma sociedade democrática só será possível quando os direitos de todos, com suas respectivas diferenças, forem absolutamente respeitados. Ressalto, entre tantos abusos, os cometidos contra as mulheres, fruto de uma herança histórica patriarcal que, sistematicamente, excluía e moldava as mulheres a papeis sociais secundários.
Cada conquista feminina foi forjada à custa de muitas lutas, muitas delas ainda não vencidas. Sofrimento, violências, abusos, desrespeitos, mas a firme convicção de que era e continua sendo preciso avançar. E as mulheres e, por que não, os homens, avançaram. Há 90 anos elas conquistaram o direito ao voto e de lá para cá foram ocupando espaços de trabalho, de poder e de liderança. Vozes que passaram a ser ouvidas, a determinar limites, a expressar seus verdadeiros papéis de protagonistas: da vida e de suas escolhas.
Organizadas, sabem que a luta de uma é a de todas. A união faz a força e juntas alcançarão em menor tempo um mundo igualitário.
Infelizmente a realidade contradiz o bom senso. No Brasil, segundo pesquisa do Instituto DataFolha uma em cada quatro mulheres no Brasil acima de 16 anos sofreu algum tipo de violência em 2020. Isso significa que cerca de 17 milhões de mulheres foram vítima de violência física, psicológica ou sexual. De acordo com dados do Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos, no primeiro semestre de 2022, a Central de Atendimentos registrou 31.398 denúncias de violência contar a mulher.
Como é possível, em pleno século XXI, tolerar o absurdo intolerável da violência contra a mulher? Misoginia, machismo, covardia, medo diante da capacidade feminina ou uma patologia injustificável, que acomete algumas mentes masculinas precisam ser combatidas.
Vera Magalhães, mulher, mãe, jornalista conhecida, competente e profundamente respeitada, vem sendo, no exercício do trabalho, sistematicamente desrespeitada por expressar fatos, verdades e exercer sua profissão. Já sofreu calúnias, difamações, injúrias e até ameaças de morte. Não se calou, nem se intimidou. Ao contrário. Na terça-feira, dia 13 de setembro, na sede da TV Cultura, após participar como jornalista de debate com os candidatos ao governo de São Paulo, foi novamente ofendida. Dessa vez, por um deputado estadual que, ao lançar mentiras e falsas acusações, partiu, de forma premeditada, para a tentativa de intimidação e desqualificação de Vera Magalhães. Sem sucesso. Ela e os companheiros de profissão não se calaram e o referido deputado será processado judicialmente e também julgado por seus pares na Comissão de Ética da Assembleia Legislativa de São Paulo.
Episódio como o vivido por Vera Magalhães é um exemplo recente de um fenômeno cada vez mais comum: agressões contra jornalistas mulheres perpetuadas por políticos e seus apoiadores. Nos primeiros sete meses de 2022 foram registrados 55 ataques com viés de gênero contra jornalistas, segundo monitoramento da Abraji (Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo). Quase metade dos casos (47%) se refere a ataques à reputação e à moral, usando a aparência, a sexualidade ou traços sexistas de personalidade para ofender as mulheres jornalistas. Em 43% dos alertas monitorados pela Abraji, a vítima cobre temas políticos.
Vera Magalhães teve e sempre terá em um Estado que luta para ser Democrático de Direito, o apoio irrestrito, não apenas da imprensa, mas de todas as pessoas, como este subscritor, que buscam uma sociedade plural, humana, igualitária e justa. Nessa sociedade não há mais lugar para tais condutas.
*É advogado criminalista, professor universitário e Secretário de Estado da Justiça e Cidadania de São Paulo.