Artigo: Liberdade de expressão?

Por André Roedel*


A semana foi marcada por uma grande “polêmica” envolvendo as falas do youtuber Monark, apresentador do Flow Podcast – um dos podcasts mais ouvidos no Brasil. No episódio da última segunda-feira (07), ele defendeu a existência de um partido nazista reconhecido por lei, enquanto entrevistava os deputados federais Kim Kataguiri (Podemos) e Tabata Amaral (PSB). A afirmação de Bruno Aiub (nome verdadeiro de Monark), de 31 anos, repercutiu internet afora, ganhando as home pages dos principais sites de notícia e virando pauta nacional. “A esquerda radical tem muito mais espaço do que a direita radical, na minha opinião. As duas tinham que ter espaço. Eu sou mais louco que todos vocês. Eu acho que o nazista tinha que ter o partido nazista, reconhecido pela lei”, comentou Monark.

Um dia após os comentários, o youtuber pediu desculpas e disse que estava bêbado. “Falei de uma forma muito insensível com a comunidade judaica e peço perdão pela minha insensibilidade”, afirmou. No mesmo dia, os Estúdios Flow anunciaram o desligamento de Monark e a remoção do episódio em questão. A decisão veio após diversos patrocinadores retirarem o apoio ao podcast, além de notas de repúdio das principais entidades – judaicas ou não – do país.

Não é a primeira vez que Monark se envolve em polêmicas. Na sanha de defender o liberalismo a todo custo, já chegou a afirmar, no Twitter, que uma opinião racista não deveria ser crime. “É a ação que faz o crime e não a opinião”, afirmou ele no ano passado. “Querem criminalizar o pensamento. Muito perigoso isso. Autoritarismo começa assim”.

A opinião de Monark foi, em sua maioria, rechaçada pela grande maioria da sociedade. Mas teve quem apoiasse e defendesse. Na maioria, são pessoas que compactuam com essa ideia da liberdade de expressão “irrestrita” – o que é impossível, pois aí seria barbárie. Vivemos em um mundo onde existem regras e leis. Mais do que isso: existe ética e moral. Defender a “simples” possibilidade de existência de um partido nazista não é liberdade de expressão, mas liberdade de ódio, além de burrice.

Defender a “simples” possibilidade de existência de um partido nazista não é liberdade de expressão, mas liberdade de ódio, além de burrice

A máxima “discordo do que você diz, mas defenderei até a morte o seu direito de dizê-lo” (falsamente atribuída a Voltaire) não se aplica para ideais genocidas. E o nazismo nada mais é que o reflexo de tudo que há de pior. A ideologia política implantada na Alemanha pelo ditador Adolf Hitler foi responsável por um dos maiores crimes da história da Humanidade, que foi o Holocausto – o assassinato em massa de seis milhões de judeus durante a Segunda Guerra Mundial.

Monark e todos os seus defensores, críticos dos chamados “canceladores” e “lacradores” – como o comentarista Adrilles Jorge, demitido da Jovem Pan após fazer um gesto nazista durante uma fala em defesa do youtuber – demonstram ignorância sobre diversos temas e, principalmente, desconhecimento total de um paradoxo apontado pelo filósofo da ciência Karl Popper em seu livro “The Open Society and Its Enemies”. Conhecido como “Paradoxo da Tolerância”, ele enfatiza que a “tolerância ilimitada leva ao desaparecimento da tolerância”. Ou seja: não podemos tolerar a intolerância, daí ser um paradoxo.

Além disso, a pressuposta liberdade de expressão não exime o cidadão de seus compromissos perante o ordenamento jurídico. Apologia ao nazismo é crime, não liberdade de expressão ou opinião. “A Constituição consagra o binômio: liberdade e responsabilidade. O direito fundamental à liberdade de expressão não autoriza a abominável e criminosa apologia ao nazismo”, publicou em seu Twitter o ministro Alexandre de Moraes, do STF (Supremo Tribunal Federal).

Fora tudo o que já foi exposto, o simples fato de Monark afirmar que fez os comentários quando estava bêbado já é de se preocupar. Afinal, ele está à frente de uma mídia de massa, com mais de 3,5 milhões de inscritos no YouTube – que é a nova TV aberta. Não há espaço para “molecagem”. Que esse episódio acenda o sinal de alerta para o tipo de material que a sociedade vem consumindo nas mídias sociais. Chega de “dar palco para maluco dançar”. Já vimos que isso não acaba bem. É momento de reflexão. E reafirmar: nazistas não passarão.


* Jornalista formado, é chefe de redação do Periscópio, editor da Revista Terraço e colaborador da Revista Campo&Cidade, com passagem pelo Portal Itu.com.br.