Cinerama: Coringa
Por André Roedel
Um filme pesado, com uma atuação magnífica de Joaquin Phoenix. Assim é Coringa, longa-metragem espetacularmente dirigido e roteirizado por Todd Phillips (da trilogia Se Beber, Não Case!). Livremente adaptado das histórias em quadrinhos da DC Comics, a nova origem de um dos maiores vilões da cultura pop é o reflexo de uma sociedade sem esperança. Com toda uma estética que remete a Nova York do começo dos anos 1980, a Gotham City deste filme está em colapso. Os serviços públicos não funcionam, o lixo se acumula pelas ruas, a criminalidade aumenta e, em meio ao caos, uma figura perturbada e com claros problemas psiquiátricos vai sendo moldada para encarar esse cenário.
Trata-se de Arthur Fleck, um palhaço que tenta uma carreira na comédia stand-up enquanto cuida de sua mãe doente. O personagem que virá a se tornar o Palhaço do Crime inicia, após alguns estopins, sua trajetória de baixos e mais baixos até perder qualquer resquício de sanidade que ainda tem. E aí Phoenix dá um show de interpretação. Entrega uma atuação visceral e com um certo estranhamento que acaba sendo natural neste Coringa. Merece Oscar.
Além de Phoenix, o elenco conta com Zazie Beetz interpretando um possível interesse amoroso do protagonista, Brett Cullen como Thomas Wayne (sim, o pai do Batman) e Robert De Niro como um apresentador de talk show – numa referência clara a O Rei da Comédia, filme de Martin Scorsese feito em 1982 e estrelado pelo próprio ator. Mas mesmo De Niro serve apenas como uma escada para a magistral interpretação de Joaquin Phoenix – eu já falei que ele merece um Oscar?
Coringa é, assim como os filmes de Scorsese e tantos outros da década de 1980 (incluo nessa lista Taxi Driver, por exemplo), o reflexo de uma nova era da desesperança. Em que as pessoas estão perdidas, sem emprego, sem assistência do governo e em busca de um “messias”. No filme, toda essa insatisfação se torna uma revolta com as camadas mais ricas, que tem a figura do palhaço como símbolo.
Como Clube da Luta e Laranja Mecânica, Coringa trata da violência sem entrar na questão moral. Muita gente pode perceber nisso um tipo de ‘glamourização’ do errado (eu mesmo me senti incomodado em alguns momentos, que foram aliados a uma trilha sonora propositalmente desconcertante e diálogos que provocavam vergonha alheia). Mas eu acredito que a arte – e Coringa é um filme de arte – está aí para provocar.
Por conta disso, a mensagem passada não é das mais sadias e o longa tem inúmeros gatilhos perigosos, mas que se justificam por contar mais uma história contundente e que só reforça a poderosa iconografia do personagem. Um grande filme, com pequenos defeitos, mas que merece ser visto na telona.
Nota: ☆ ☆ ☆ ☆ ☆