Espaço Acadil: O canto das sereias

Guilherme Del Campo
Cadeira nº 11 | Mario de Andrade

Nove de março de 1500. Naquela manhã de calor, céu azul e vento favorável a armada composta por treze navios içou velas e deixou o porto de Lisboa, enviada pelo rei D. Manuel, o Venturoso, destinada às Índias atrás de especiarias. A frota do fidalgo Cabral era composta por nove naus, três caravelas e uma naveta de suprimentos. A tripulação era composta por navegantes, oficiais, boticários, religiosos, calafates, degredados e de menores. Mulheres não eram permitidas. Houve um desvio na rota primitiva, talvez proposital, na tentativa de descobrir novas terras.

Durante o percurso a tripulação alimentava-se de carne malcheirosa conservada com sal e pimenta, água racionada quase salobra, biscoitos, peixes salgados e vinho.

Enfrentaram tormentas e calmarias além de doenças como escorbuto que fazia sangrar as gengivas. Uma das naus após dias de viagem e sob forte tempestade com cento e cinquenta homens desapareceu para sempre nas profundezas do mar Tenebroso. Após alguns dias outra das naus desgarrou-se do grupo e não mais foi vista.

Nesta nau perdida ouviu-se um canto melodioso que vinha do mar ao seu redor. Marujos correram para a balaustrada afim de verificar de onde vinham aqueles cantos e observaram sobre as águas dezenas de lindas sereias de corpos perfeitos, nuas com seios à mostra, cabelos longos e sedosos e belas como deusas a convidá-los para um mergulho.

Fascinados diante de tanta sensualidade, os marinheiros e tripulantes num acesso de loucura coletiva, atiraram-se ao mar atrás delas e pereceram nas profundezas do mar.

A nau esvaziada ficou à deriva sem a presença do piloto no comando do leme e após forte tempestade que lhe rasgou as velas e ter adernado perigosamente, foi a pique.

O restante da frota após quarenta e quatro dias no mar e do alto do cesto de gávea ouviu-se um marinheiro soltar o famoso grito: “Terra à vista”! Acabara de avistar o cume de um monte, batizado de monte Paschoal, visto a proximidade da páscoa e terra firme.

Arriaram-se os escaleres e um grupo de marinheiros aportou numa praia repleta de indígenas que os confundiram com deuses. Os marinheiros enlouqueceram ao observar lindas indígenas nuas e sorridentes que lhes trouxeram carne de caça, água fresca além de frutas desconhecidas e os convidavam para um banho no rio.

Batizou-se inicialmente a nova terra como Ilha de Vera Cruz, pois desconheciam que estavam diante de um novo continente. E no dia vinte e seis de abril de 1500, o frei Henrique de Coimbra celebrou a primeira missa em agradecimento e regozijo diante daquela descoberta. Os indígenas mesmo sem compreender as falas dos estrangeiros, acompanharam a celebração em absoluto silêncio e respeito.

O Brasil acabava de ser descoberto em vinte e dois de abril de 1500 para a glória dos intrépidos portugueses e de Dom Manuel, rei de Portugal.