Filhos da alienação
Por Daniel Nápoli
No último sábado, foi realizado na Praça da Matriz o evento “Vigília pelas Mulheres”. Ato louvável organizado pelo núcleo de mulheres do PSOL (Partido Liberdade e Solidariedade), do Coletivo Rubi e do Levante Popular da Juventude, com o objetivo de levar à sociedade a reflexão, a conscientização sobre a violência contra a mulher, ao fim da cultura do estupro e valorização feminina.
A dinâmica do evento chamou atenção para o cenário em que estamos vivendo. “Cabeças pensantes” com ótimos discursos e atitudes, porém com pouca representação.
Enquanto dezenas de pessoas ali participavam de uma roda de conversa, discutindo a respeito de temas delicados como o abuso sexual, entre outros assédios e violências contra a mulher, outras mulheres, em sua maioria, jovens, na mesma Praça da Matriz, se encontravam completamente alheias aos assuntos, aguardando o início da “batalha dos rappers”.
Nada contra o evento, mas o que ali impactou foi o fato de mulheres tão próximas a uma discussão que as envolve diretamente, comportavam-se como se a violência não existisse e que não precisasse discutir e dialogar a respeito do tema.
Cada um tem o direito de prestar atenção e de ouvir o que quiser, claro, mas foi no mínimo desrespeitoso presenciar as organizadoras do evento utilizando o megafone tentando dialogar com aquelas pessoas, sem haver uma empatia.
Outro ponto negativo que chamou a atenção foi que essas mesmas jovens se encontravam ao lado de namorados e amigos, que, ao invés de pararem para prestar atenção, também “deram as costas” para a causa.
Uma das causas para a manutenção da cultura do estupro, ou de qualquer outra violência contra a mulher, está justamente na “alienação”. O silêncio também é uma forma de alimentar esse mal.
A partir do momento em que se deixa de prestar atenção, deixa-se de discutir, de se refletir a respeito do assunto, não se cria uma consciência, uma união de fato contra o machismo e a violência.
E, quando esse silêncio ocorre em meio a jovens, que estão terminando de moldar sua personalidade, seu caráter, é ainda pior, já que ali está o futuro da sociedade e indiretamente essa geração passa a compactuar com os crimes envolvendo a mulher, sim.
A violência contra a mulher precisa e deve ser discutida à exaustão por homens e mulheres, de todas as idades. Ninguém deve se calar. Virou clichê, mas o silêncio dos bons é tudo o que as pessoas de má índole necessitam.
A mulher vítima deve denunciar seu abusador, não deve ter vergonha ou medo, assim como o pai, o filho, o marido ou namorado, irmão, enfim, qualquer homem deve apoiá-la e também incentivar a denúncia e campanhas de combate a violência.
Vergonha deveria ter o homem (?) que comete tais crimes e vive em meio à sociedade como se nada tivesse acontecido e, o que é pior, ao lado de muitas mulheres que nem imaginam do que aquele indivíduo é capaz.
Por isso, discutam em casa, na escola, na faculdade, no trabalho, nas praças, enfim, em todos os lugares. Reflitam e se conscientizem.
As mulheres não conseguiram ingressar no mercado de trabalho com meia dúzia falando para centenas de outras mulheres desinteressadas. Assim como não passaram a ter direito ao voto vivendo de forma alienada.
Esses direitos conquistados só foram possíveis por meio de muita luta e união de diversas “cabeças pensantes”. Pensem nisso!