Lição de ciências
J.C. Arruda
Dia destes encontrei com o Marcos Figueiredo que fez o ginasial comigo na Escola Regente Feijó. Como já fazia mais de 40 anos que a gente não se via, houve um pouco de dificuldade para que um reconhecesse o outro. Eu estava ali na banca de jornal da praça vendo as capas de revistas com as manchetes das novelas. Sou um dos raros homens que se assume como noveleiro contumaz. Chego até a torcer para que a Rita dê uma surra de pau na Carminha antes que “Avenida Brasil” chegue no final. Mas, deixa me voltar para o encontro com o Marcos.
Ele bateu nas minhas costas e foi logo perguntando com certa convicção: – “Você é o Arruda, não? Aquele que era amargo até no nome, como dizia o Professor Lourenço Carmignani…” De cara não o reconheci por causa da barba e bigode que ele usa agora, provavelmente para disfarçar a careca, já acentuada. Para ajudar, me lembrou do apelido que tinha e que detestava: “Marquinho Coxinha”. Aí minha mente clareou e iniciamos o papo. Claro que sempre na base das reminiscências.
Quase toda a conversa girou em torno do assunto que nos era comum: a vida no glorioso Instituto de Educação Regente Feijó. Lembramos dos professores de nossa classe: Seu Pery (desenho) Dona Carolina (Português), Professor Zé Luiz de Oliveira (Latim) Cidão Scalet ou Dona Gláucia (Matemática) Professor Firmino (Fisolofia) Seu Carmignani (Trabalhos Manuais) Professor Luizito (Música) Edu Tocheton (Educação Física) e mais alguns cujo nomes não me ocorrem no momento.
Depois passamos a enumerar as garotas mais lindas cujos nomes aqui seguem, sem o sobrenome para não dar encrenca, considerando-se que a maioria delas está casada até hoje e com maridos ciumentos: Deise, Selma, Lucinha, Eusalir, Jussara, Jussimara, Dalza, Zeca, Maria Amália, Carmem Silvia, Vera, Sônia, Clélia, Marivane, Cecília, Suzana, Fátima, Marta, Gislaine, Marcia e deixem me parar por aqui, senão essa página não será suficiente para todas elas que enfeitavam os sonhos sensuais dos ainda meninos, na época.
Em seguida, o Coxinha (desculpe o costume, Marcos!) passou a relembrar casos e episódios que marcaram a nossa presença no Regente. Os pileques que a maioria acabava tomando nas brincadeiras-dançantes, na base do ponche ou quando muito umas cervejinhas; o fumacê que era resultado daqueles que fumavam escondidos nos sanitários, fumacê esse que chegava a se caracterizar pela inocência, pois nem mesmo a maconha fazia parte das pilantragens da época. No máximo a moçadinha começava a descobrir um prazer que nos parecia deliciosamente pecaminoso: cheirar lança-perfume durante o carnaval.
Na hora da despedida ele me pediu para contar no Periscópio o episódio que envolveu um professor e um aluno da nossa Classe. O professor era o Doutor Felipe Nagib Chebel que tinha sido Prefeito de Itu e era médico da Fábrica São Pedro de tecidos e de grande parte das famílias de Itu. Até o fim da vida, Doutor Chebel era professor do Regente, mais pelo prazer do que pelo salário considerando-se que sempre foi um homem de bens. O aluno era o Mário Braga, um dos mais queridos da classe, mesmo porque era também o maior gozador entre todos nós.
Foi no período da tarde e a aula era de ciências, se não me falha a cabeça. O mestre Doutor Chebel entrou na sala, com uma pequena maleta que ficou sobre a mesa durante quase toda a aula. Para encerrar, ele abriu a maleta, tirou dela dois copos tipo americano. E todos nós super atentos e curiosos. Deveria ser alguma experiência. E era. Tratava-se de um tema versando sobre os males do alcoolismo. Um dos copos ele encheu de água; o outro encheu de cerveja.
Em seguida pegou uma caixinha de papelão, onde havia dois vermes que se contorciam. Colocou um deles no copo de água e o bichinho nadou agilmente, como se estivesse feliz e brincando. A seguir colocou o outro verme no copo com cerveja. O bicho se contorceu ainda mais como se quisesse desesperadamente sair do líquido. Depois afundou como uma pedra, absolutamente morto.
Evidenciando satisfação, Doutor Chebel olhou para os alunos, perguntando: – “E então, que lição podemos aprender com essa experiência?”
Antes dos outros, Mário Braga ergueu a mão e, mesmo antes da autorização para falar, rapidamente respondeu:
– Bebendo cerveja, nunca teremos vermes!
Marcos Coxinha ainda destacou:
– Todos aplaudimos o Mário Braga… de pé!