O PADRE E A VILA DE JENIPAPO
Pense numa vila com todas as habitações construídas sobre palafitas, aquelas estacas de madeira que colocam a casa em nível mais alto, para que não seja tomada pelas águas em tempos de inundações. Em vez de ruas, precárias passarelas de madeira, também em palafitas.
Agora pense em muitas dessas casas inteiramente construídas em sapé. Paredes em madeira só para famílias de melhor situação econômica. Melhor ainda no caso, raro, dessas paredes pintadas.
Para vender a pesca, dependiam de atravessadores que lá chegavam de barco com caixas de gelo, para conservar o produto até Belém. Valores baixíssimos. Para a criança escapar da pobreza, uma saída era oferecê-la para adoção. Mexeu com meu coração. Que dor uma mãe deve sufocar ao abrir mão de seu “filhote”!
Passaram-se tantos anos, essa vivência ficou na memória como um sonho inesquecível. Até que decidi pesquisar na internet sobre esse local. Boas surpresas!
Nas fotos, nenhuma casa em palha. Em artigo da revista Ciência Hoje das Crianças (http://chc.org.br/historias-do-marajo/) de Salvatore Siciliano – um zoólogo na Fundação Oswaldo Cruz (RJ) que, segundo ele mesmo, adora “viajar pelo Brasil descobrindo detalhes interessantes sobre nossos bichos e nossa cultura!” – o relato do ‘caso das piranhas envernizadas’, que vale compartilhar. Conta sobre o incrível jesuita italiano Giovanni Gallo, que chegou à região nos mesmos anos 1970 e se tornou mais conhecido como criador do Museu do Marajó, na pequena cidade vizinha de Cachoeira do Arari.
Inspirado no que viu numa loja de lembranças para turistas em Belém – uma piranha embalsamada e envernizada – o padre pesquisou como fazer e capitaneou a produção em série desse artesanato, com a melhor qualidade, em sua paróquia, envolvendo bem pagas moradoras da própria comunidade.
Com o sucesso da venda de doze mil peças embalsamadas em toda Europa, o padre obteve recursos para muitas melhorias que pareciam impossíveis até então. Entre elas, novas pontes, passarelas e um trapiche comunitário em Jenipapo, tão bem feitos que ainda permaneciam em ótimo estado quando da visita do zoólogo-viajante à região, em 2015.
Sílvia Czapski
Cadeira nº 04 I Patrono Benedito Lázaro de Campos