O terror das churrascarias
J.C. Arruda
Só quando completei 30 anos é que saí de casa para morar sozinho, por minha conta e risco, já que não tinha o menor plano de me casar. Fui morar então num pequeno quarto que me foi alugado, dentro da casa de um senhor chamado Mário Barsalini, viúvo, onde também vivia o filho dele, Valdomiro Barsalini. Alí fiquei por cinco anos muito felizes, pelo menos para mim. Eu pagava o aluguel e dividia com os dois, as despesas da casa, incluindo empregada, alimentação etc. etc.
O velho Mário já tinha por volta de 80 anos e ficamos super amigos. Não acredita? Só por causa da diferença de idade? Pois fiquei. Você que está lendo estas linhas fique sabendo que nós dois eramos “noveleiros”. Toda noite a gente curtia “Anjo Mau” com a Suzana Vieira, inclusive deglutindo uma bacia de pipocas. Quando chegava um circo na cidade, a gente não perdia. Ele gostava muito e eu idem. Futebol também. Fomos várias vezes ao Pacaembu ver jogos do Corinthians e do Palmeiras. Eu torço para o timão e ele era do verdão. Era uma companhia super agradável.
Em compensação, o filho, Valdomiro, morria de ciúmes dessa amizade. Vivia me criticando para me provocar, principalmente porque ele era Volpatista (do Olavo Volpato) e eu Piuntista (do Lázaro Piunti) na política local. Fora essas picuinhas, Valdomiro era uma figura. Era engraçado, espirituoso e, acima de tudo, um glutão. Quando se assentava a uma mesa, comia de tudo muito, e ainda pedia mais. Quando surgiu a Churrascaria Minuano em Itu, o sistema de rodízio ainda era novidade na cidade. Combinamos de levar o velho Mário para experimentar. Pegamos os três, uma mesa só para nós. E começamos a odisséia!
Seu Mário se encantou com aquilo. Imaginem: comer carne a vontade por um preço fixo! Mas, quem deu mesmo trabalho aos garçons, foi Valdomiro. Não deixou de passar incólume nenhum espeto, fosse qual fosse o tipo de carne. Era costela, maminha, lombo, linguiça, frango, pernil, peixe etc. etc. Picanha então, foi um arraso. Não havia o que chegasse! Chegamos no Minuano as 12:30 horas e já passava das 15 horas e eu e o seu Mário assistindo Valdomiro se deliciar. Até que chegou um momento que mesmo um estreante em rodízio, como o velho Mário, estrilou: – “Puxa Valdomiro, a mesa aqui do lado já trocou de fregueses três vezes e nós vamos até que hora?” Aí, chamamos o garçom para fechar a conta.
Mas, me deixe resumir.
Só fui sair da casa deles em 1978, para morar com meu pai que havia regressado a Itu, após residir 30 anos em Osasco. Mesmo assim continuei a frequentar pai e filho, sendo que, após a morte do velho Mário, conquistei a amizade verdadeira de Valdomiro que se mostrava sempre grato a mim quando, na verdade, eu é que sempre fui devedor deles por um período feliz da minha vida. Mais tarde, fiz o que pude para que dessem o nome de Mário Barsalini para uma das ruas da cidade, mas não consegui. Quanto a Valdomiro, que não tinha a menor vocação para casar, acabou encontrando Dona Cida, o amor da vida dele. Casaram e tiveram um filho. Adivinhem o nome do rapagão. Isso mesmo, Mário, em homenagem ao avô.
Mas, voltemos à Churrascaria Minuano, quando esperávamos o garçom trazer a conta, quem veio foi o próprio Plínio Bernardes, o proprietário que foi logo avisando: – “A despesa dos três ficou em $ 160,00, mas da próxima vez eu é que prefiro entregar $ 200,00 para o Valdomiro. Ele que vá almoçar sozinho no Bar do Alemão…”