Os meninos das Matinês
Em “Os meninos de 58” abordei a Copa do Mundo, com ênfase na bola amarela e a nossa tristeza ao perdê-la. Agora, relato outra paixão além do futebol. As matinês aos domingos à tarde no Cine Sabará, no largo da Matriz em Itu.
Reuniam-se garotos por volta dos 10, 12 anos de idade, todos de cabelo escovinha ou fuzileiro que, entre pacotes de pipocas e cartuchos de amendoim torrado, carregavam nos braços pilhas de gibis. Rodeávamos o carrinho do “seo” Emerson, que tinha um slogan – “pipocas sem contacto manual”! Naquela época eu acreditava que as pipocas eram as melhores, mas não entendia essa história de “sem contacto manual”.
Nas décadas de 50 a 60, os gibis sofreram severas críticas dos educadores, tanto pelo conteúdo como pela forma. Foram considerados provocadores da delinquência juvenil, estimuladores do crime e ameaça à moral e aos bons costumes. Muitos pais proibiram esse tipo de leitura, entretanto os gibis sobreviveram e fizeram sucesso.
A primeira revista infantil surgiu por volta de 1905, através de Angelo Agostini (1843-1910), denominada “O Tico-Tico”. Entre os mais antigos encontramos: Bolão e Azeitona; Abot e Costelo, entre outros.
Predominavam os gibis de faroeste: Cisco Kid; Roy Rogers; Hopalong Cassid; Durango Kid; Zorro; Bat Masterson e outros, como Fantasma; Tarzan; Superman; Capitão América; Mandrake; Flash Gordon; Homem Aranha, e os infantis de grande sucesso: Pato Donald; Mickey; Pernalonga e Luluzinha, inclusive os almanaques.
Para entrar no cinema os garotos formavam duas filas: a primeira comprava os ingressos, a segunda ingressava na plateia. As cadeiras eram de madeira, barulhentas e desconfortáveis, fora a algazarra ensurdecedora da criançada.
Antes das seções era intensa a troca de gibis, envolvendo grande negociação.
No início das projeções exibiam-se os seriados, eu me lembro de alguns que deixaram saudades: A Ilha do Tesouro; O Agente Secreto; Os Anjos de Cara Suja etc…
Às vezes, após os seriados, éramos contemplados com desenhos coloridos do Walt Disney, como o Pato Donald e seus sobrinhos; a Margarida; Mickey e o Pateta; Tio Patinhas e sua moeda da sorte; o sortudo do Gastão e a vovó Donalda que fazia deliciosas tortas de maçãs que colocava na soleira da janela para esfriar e eram surrupiadas pelo safado do Gançolino. A criançada gritava de prazer.
Depois dos desenhos começavam os filmes principais, geralmente chamados de “capa e espada” como: Os Três Mosqueteiros; O Homem da Máscara de Ferro; A Marca do Zorro… Predominavam os westerns cujos heróis eram: Randolph Scott; Rock Lane; John Wayne; Andie Murphy; Yul Brynner; Lee Van Cleef e as atrizes Suzan Hayward e Dorothy Malone, entre tantas outras.
Sentávamos juntos: eu, meu irmão, Carpinho, José Eduardo, os irmãos Nabil e Munir que traziam sementes torradas de abóbora e nos ofereciam.
Munir comia sofregamente as sementes e falava sem parar, antecipando o desfecho das cenas. Mandávamos ele calar a boca e acho que ele não aprendeu e deve fazer isso até hoje.
Os meninos e as matinês dos domingos nunca mais serão os mesmos.
Guilherme Machado Del Campo
Cadeira nº 11
Patrono Mario de Andrade