Página em branco
Por Lucas Gandia
No ofício do jornalista, poucas coisas são tão angustiantes quanto o desafio da página em branco. Ao sentar-se à frente do computador, vem à tona a complexa missão de relatar as memórias de alguém. Como iniciar o texto? Como escolher a palavra exata para narrar os fatos? Como ser criativo, mas ao mesmo tempo preciso? Como garantir o respeito à experiência alheia? Diante da tela em branco, temos a responsabilidade de começar, inúmeras vezes ao dia, uma nova história. Nessa rotina, ter disciplina é importante, mas reinventar-se é fundamental.
A partir do dia 1º de janeiro de 2017, uma página em branco se abrirá em Itu. Após oito anos de gestão de Herculano Passos (PSD) e quatro anos de comando de Antonio Luiz Carvalho Gomes “Tuíze” (PV) – que, embora rompidos desde o ano passado, ainda são vistos como representantes de um mesmo grupo político por grande parte da população –, caberá a Guilherme Gazzola (PTB) o governo de nossa cidade até 2020. A pressão será grande; a expectativa da população, maior ainda.
Desde a noite do último domingo (2), tenho lido e ouvido muitos comentários de ituanos pautados na palavra “esperança”. O resultado das eleições municipais de 2016 surpreendeu muita gente, até porque poucos acreditavam na vitória dos adversários do atual vice-prefeito Neto Beluci (PRB) e da deputada estadual Rita Passos (PSD). Gazzola correu por fora – e é justamente por isso que, hoje, é visto como a possibilidade do novo; da mudança em uma classe política desacreditada e desprestigiada.
Com apenas 646 votos a mais que o segundo colocado – o que configura a eleição mais apertada da história de Itu –, o novo prefeito terá o desafio de governar para uma cidade dividida. Dono da confiança de 22.582 eleitores, o cirurgião-dentista e ex-vereador terá de administrar as expectativas de 168.643 munícipes, pertencentes a realidades culturais e socioeconômicas completamente distintas.
E mais: Gazzola não só governará para os 58.070 apoiadores de outros candidatos, como terá de (re)conquistar a confiança de 41.861 pessoas que se abstiveram ou preferiram votar branco e nulo no pleito deste ano. Tudo isso em um Executivo com muitas demandas e poucos recursos, o que, por si só, já dificulta a tarefa de qualquer administrador.
Uma rápida análise da nova formação da Câmara Municipal apenas reforça a insatisfação dos ituanos com os atuais líderes de nossa cidade. Dos treze vereadores em mandato, apenas dois foram reeleitos – e, mesmo assim, com votações abaixo do esperado. Edis experientes e populares (ou populistas?) ficarão de fora do novo Poder Legislativo de Itu, pasmando até os mais descrentes na política. É bem verdade que, em 2017, conhecidos figurões voltarão a dar as caras na Casa de Leis, mas, ainda assim, com menos prestígio de que já gozaram em um passado não muito distante.
Diante desse cenário, cabe um apelo aos futuros representantes de Itu: honrem seus compromissos e trabalhem pela população. Não se nivelem por baixo e não transformem honestidade em falácia. Fujam dos discursos dualistas. Ao prefeito eleito, fica a missão de se cercar de uma equipe competente, formada por profissionais comprometidos e, sobretudo, que realmente gostem de nossa cidade. Do contrário, os interesses coletivos continuarão sendo esmagados pelas ambições individuais.
Em um contexto de tantas expectativas e frustrações, só nos resta olhar para frente e nos reinventarmos. A página em branco, de fato, é um grande desafio, mas também é o ponto de partida de novos projetos. É a possibilidade de superar resistências, vícios e percepções do que já existe, para avançar em direção ao novo. A página em branco é o futuro – e já começou a ser preenchida por uma nova história.