Pandemia, 5 anos depois: o que mudou?
No dia 11 de março de 2020, o biólogo etíope Tedros Adhanom Ghebreyesus, diretor-geral da Organização Mundial da Saúde (OMS), decretava oficialmente a pandemia de Covid-19. A reação foi imediata: eventos foram cancelados, governos começaram a tomar medidas para mitigar os impactos e os cientistas iniciaram uma corrida por remédios e vacinas contra a doença. Também houve muito negacionismo, o que vitimou milhões de pessoas mundo afora. No Brasil, foram mais de 700 mil mortes confirmadas.
Cinco anos depois, voltamos a ter uma vida “normal”. As vacinas ajudaram a impedir mais mortes, o uso de máscara já não é mais obrigatório e podemos nos reunir em eventos, festas e confraternizações novamente. Mas algumas mudanças vieram para ficar. Reuniões que antes eram presenciais passaram a ser feitas por videochamada e muita gente não abre mão do álcool em gel dentro da bolsa ou mochila.
SAÚDE
Há cinco anos, a humanidade foi surpreendida pelo início da pandemia de Covid-19. O que imaginávamos ser uma quarentena temporária se transformou em dois anos de desafios intensos. No começo, com pouca informação técnica sobre o vírus e sua disseminação, nós, médicos, dependíamos das notícias da mídia para entender o que estava acontecendo.
Ficamos em casa, sob fortes restrições, enquanto os serviços de saúde tentavam se organizar para a sobrecarga que viria. Os primeiros meses foram marcados por incertezas e pelo desconhecimento sobre tratamentos eficazes. Aos poucos, descobrimos o potencial das redes sociais para a troca de informações médicas. Aulas, textos e discussões entre profissionais ajudaram a aprimorar o cuidado com os pacientes. O uso de corticoides, anticoagulantes e outras estratégias médicas passou a salvar vidas, mas, infelizmente, nem todos resistiam à gravidade da doença.
As equipes de saúde foram reconhecidas como heróis, mas a realidade era dura: trabalho exaustivo, hospitais lotados, colegas adoecendo e a pressão emocional constante. A maioria resistiu bravamente, enfrentando quase dois anos de uma rotina desafiadora.
Com o tempo, as incertezas foram sendo superadas, e os tratamentos se tornaram mais eficazes. A chegada da vacina foi um alívio, trazendo esperança e reduzindo gradualmente a superlotação hospitalar. Mas os impactos da pandemia não terminaram ali.
O sistema de saúde sofreu as consequências do longo período de restrições. Muitas pessoas, que por dois anos não puderam realizar exames e consultas de rotina, tiveram o agravamento de doenças crônicas e o diagnóstico tardio de enfermidades graves, como o câncer. Além disso, os pacientes que contraíram Covid-19 e desenvolveram sequelas seguem em acompanhamento médico.
A saúde mental também foi profundamente afetada. O isolamento social, o medo da doença e das perdas, o desemprego e as mudanças na rotina, como o home office e o ensino remoto, deixaram marcas psicológicas que ainda se fazem presentes. Crianças e adolescentes, por exemplo, tiveram dificuldades em se readaptar à escola presencial após tanto tempo longe das salas de aula. O aumento de casos de depressão e ansiedade reforça o quanto a pandemia impactou o bem-estar emocional da população.
Olhando para trás, temos a sensação de uma batalha dura e desafiadora que conseguimos superar. A pandemia nos trouxe aprendizados valiosos na área da saúde, mas os desafios ainda não terminaram. As consequências desse período seguirão sendo sentidas por muito tempo, e ainda não sabemos exatamente a extensão dos danos a longo prazo.
O que fica é a necessidade de cuidar não apenas do corpo, mas também da mente e de fortalecer o sistema de saúde para que possamos enfrentar melhor qualquer desafio futuro.
Por Dra. Ana Claudia Chiari – Hematologista e Diretora de Administração e Finanças da Unimed Salto/Itu
EDUCAÇÃO
Quando afirmamos que a pandemia da COVID-19 modificou o mundo, não podemos negar que as instituições educacionais passaram por grandes transformações. Em nosso colégio, não foi diferente. Assim que foi decretado o afastamento dos alunos, professores e funcionários do ambiente escolar, começamos a realizar reuniões remotas para determinar as primeiras providências a serem tomadas em relação à aprendizagem das crianças. Grandes plataformas, que até então eram utilizadas esporadicamente, passaram a ser a “voz e os ouvidos” dos professores dentro da casa de cada aluno. Tínhamos que lidar, nesse primeiro momento, com o medo das crianças e de seus familiares diante da doença que atingia nossa comunidade, além da incerteza do que ainda estava por vir.

Fomos, aos poucos, introduzindo, através da tecnologia e dos materiais virtuais, os conteúdos ministrados a cada série, garantindo, assim, um tempo de aula de qualidade diariamente. Afinal, para nós, seriam poucos dias afastados do Almeida Júnior. Neste período, um dos maiores desafios foi, sem dúvida, adaptar-se ao uso do computador e do celular e ao mundo tecnológico. Muitos profissionais e as próprias famílias não tinham o hábito de trabalhar diariamente com o mundo virtual, uma vez que nosso material era físico e a plataforma digital utilizada para as atividades complementares. Os professores começaram a improvisar em suas casas lousas e materiais para criar aulas dinâmicas; utilizavam vídeos, filmavam contações de histórias e usavam materiais do cotidiano para explicar e exemplificar os conteúdos de cada bimestre.
Aos poucos, fomos garantindo a construção das aprendizagens. As séries que demandavam cuidados maiores eram os anos iniciais do Fundamental 1, onde ocorre a alfabetização e a transição da letra de forma para a letra cursiva e tornava-se difícil uma vez que a professora desempenha um papel fundamental nessa construção, pois ‘pegar na mãozinha’ do aluno para ajudá-lo a desenhar cada letra ou palavra é essencial.
A cada período em que anunciavam a extensão do isolamento, percebíamos o desânimo das crianças, pois estar em casa, sem o contato social que o colégio proporcionava diariamente, estava deixando-as, em alguns momentos, depressivas. Apesar de estarem em família, todos trabalhavam remotamente e não podiam dispensar atenção aos pequenos e aos jovens. Alguns pais, nessa época, relataram que acabaram invertendo seus horários de trabalho para estar com os filhos, optando por trabalhar durante a noite para ter um período do dia livre e ficar com eles.
Mas, como dizem, “não há mal que não traga um pouco de bem”, nossa instituição escolar conseguiu superar esse período, e muitas ferramentas utilizadas tornaram-se companheiras permanentes nas salas de aula. O mundo virtual ampliou as explicações e os saberes dos professores, trazendo o conhecimento em tempo real para a sala de aula. Conectou amigos, vizinhos, cidades e países, permitindo a busca e a troca de estudos de forma globalizada.
O retorno das crianças ocorreu gradualmente, e as aulas híbridas (presenciais/virtuais) tornaram-se o novo desafio a ser vivenciado. Atender às demandas dos alunos presentes na sala de aula, enquanto alguns ainda acompanhavam os estudos de casa, foi a nova fase pós-isolamento.
O retorno das crianças nos trouxe preocupações reais. Muitos chegaram com crises de ansiedade e pânico. As máscaras, o álcool em gel, o distanciamento e outras regras sociais foram observados e cumpridos a fim de evitar o contato e o perigo da doença. Alguns alunos estavam abalados com a perda de parentes próximos e, todos os dias, sentiam a necessidade de relatar seus medos e sofrimentos. Acolhíamos esses alunos com palavras e gestos de carinho para que se sentissem reconfortados.
Hoje, após cinco anos dessa tragédia mundial, percebemos mudanças comportamentais e sociais nas crianças e nas famílias, de modo geral. As regras de distanciamento e os cuidados com a saúde passaram a fazer parte do dia a dia, e o uso do álcool em gel tornou-se um hábito, principalmente entre os alunos mais velhos. Compreendemos que a falta do ambiente escolar por quase dois anos também impactou a aprendizagem das crianças. Muitas acabaram desenvolvendo transtornos que interferem em sua aprendizagem e necessitam de cuidados extras com terapeutas e psicólogos.
Sentimos que a sociedade, de modo geral, (re) descobriu, após esse período, o valor real das escolas e dos professores que atuam diariamente com crianças e jovens. Nos dias atuais, o ambiente escolar deve ser harmônico, saudável e, principalmente, parceiro das famílias que se preocupam e buscam sempre deixar a seus filhos a verdadeira herança: a EDUCAÇÃO.
Por Diretora Geral do Colégio Almeida Júnior, Maria Rita Geloramo Pascale e Diretora pedagógica e Coordenadora da Educação Infantil e Ensino Fundamental I do Colégio Almeida Júnior, Claudia Maria Ceratti Capelli
MUDANÇA

Confira entrevista com Marco Gonçalves, formado em jornalismo, com pós-graduação em Fotografia Contemporânea e em História da Arte, é artista e gestor de Matiz Ateliê Visual, espaço dedicado às artes visuais em Itu.
1) Como você recebeu a informação da pandemia? Quais foram as primeiras atitudes tomadas?
Quando a pandemia apareceu, eu vivia um momento de boas expectativas em Sorocaba, onde morávamos havia dois anos. Meu espaço dedicado às artes visuais ocupava um novo endereço, mais espaçoso, e eu fazia uma especialização em História da Arte, na Belas Artes de São Paulo. Planejava a primeira exposição nesse novo local, que seria a quarta na cidade, e tinha um grupo de estudos em andamento. Tivemos que suspender tudo. Paguei um aluguel reduzido, fruto de um acordo com o proprietário, por vários meses até vencer o primeiro ano de locação. Fechamos o boteco e ficamos isolados em nosso apartamento. Ao menos eu tinha as aulas da pós-graduação on-line, o que me manteve em atividade, com mais tempo para estudar. Mas, como sou asmático, me sentia muito vulnerável.
2) Sobre sua vinda para Itu, a pandemia foi um dos motivos? Quais benefícios você teve vindo para cá?
Não estava em nossos planos sair de Sorocaba antes da pandemia. O que ocorreu é que, no primeiro semestre de 2021, apareceu uma pessoa interessada em comprar um imóvel que eu tinha em Brasília, onde vivi por 15 anos. Aí, conversamos em família e achamos que, com a grana da venda, poderíamos sair do aluguel e mudar para um lugar mais tranquilo, talvez para um cidade menor, com menos trânsito, menos gente, menos contato humano (risos). Eu realmente me sentia amedrontado pelo fato de ser asmático. Não conhecia Itu muito bem, só havia visitado a cidade duas ou três vezes. Na decisão de mudar para cá, pesaram três coisas: o fato de ser uma cidade turística, com um patrimônio histórico bem conservado. A localização, próxima tanto de Tietê, a cidade dos meus sogros, como de São Paulo, a cidade onde moram meu filho e minha mãe. E o fato de ter uma população que não passava de 200 mil habitantes, pois àquela altura, quanto menos gente, melhor. Achamos uma bela casa em um pequeno condomínio, fora da região central e próximo à rodovia Santos Dumont. Eu nunca havia morado em uma casa quando adulto, sempre em apartamentos. Essa mudança, totalmente imprevista, foi um efeito colateral positivo da pandemia.
3) Quais os principais impactos você acredita que a pandemia deixou na humanidade, além das muitas perdas?
Quase nada. A rigor, apenas aquela parcela da população global mais instruída e bem informada, que é minoritária, adotou mudanças em suas vidas. Embora eu seja paulistano e pudesse viver em São Paulo, decidimos levar uma vida mais leve e sustentável. Decidimos abrir mão de certas coisas em favor de uma vida desacelerada e mais segura em Itu. Aqui, temos esse problema crônico da falta de água, que é apenas mais um sintoma da exploração desenfreada dos recursos naturais. Mas somos um casal, conseguimos lidar com esse problema sem grandes sobressaltos. Se precisar, a gente fica uns dias sem tomar banho (risos).
4) O que ficou de legado do período de isolamento social em sua vida?
A decisão de viver em uma cidade de menor porte foi o evento mais marcante, algo estrutural. Aqui em Itu, em maio de 2023 reabrimos nosso espaço dedicado às artes visuais, chamado Matiz Ateliê Visual. Já fizemos oito exposições em dois anos, angariamos muito amigos e levamos uma vida tranquila. Como eu nunca havia morado em uma cidade com menos de 500 mil habitantes, estamos passando por um processo de reeducação social (risos). Talvez eu ganhe menos dinheiro aqui, mas estamos mais satisfeitos com nossa vida.
5) Por fim, você acredita que a humanidade está mais preparada para uma possível futura pandemia?
Antes de trabalhar com artes, trabalhei com ecologistas em entidades dedicadas à conservação da natureza e às políticas socioambientais. Havia uma ecóloga que costumava dizer, em tom de alerta, que as intervenções humanas nos processos naturais e, especialmente os rumos da biotecnologia, potencializavam a ocorrência de catástrofes como a pandemia da covid-19. Não é o caso de aprofundar o tema aqui, mas, essas atividades que submetem os componentes da natureza a condições de exploração nada sustentáveis não foram interrompidas após a pandemia. A pandemia não foi capaz de produzir uma articulação global de alto nível, multilateral, que conduzisse a uma avaliação crítica profunda do rumo que estamos dando às nossas atividades e a nossa relação com as demais formas de vida. Pelo contrário: segmentos da sociedade que desprezam o multilateralismo e combatem a crítica e a ciência humanistas estão hoje em posições de liderança global. Ou seja, seguimos cegos até a próxima crise. Difícil ser otimista diante desse quadro.