Periscópio Entrevista: Gustavo Quirino

Nesta semana, o “Periscópio” entrevista o Dr. Gustavo Quirino, advogado e coordenador/presidente da Comissão de Compliance e de Estudos de Combate à Corrupção da Subseção da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil) de Itu.

O grupo, criado em dezembro do ano passado, tem o intuito de difundir políticas e ideias para combater a corrupção. É exatamente este tema, considerado um dos maiores males da sociedade brasileira, que pauta a conversa com o advogado. A entrevista ainda aborda as diferentes formas como a corrupção se manifesta na realidade dos brasileiros e os planos futuros da Comissão na cidade.

 

JP – Nos últimos meses, os noticiários nacionais foram tomados por escândalos de corrupção. O senhor avalia essa “enxurrada” como benéfica ou prejudicial para o engajamento da sociedade com a política do país?

 

Sempre preferi mais a informação do que a ignorância. O cidadão deve ser alertado de todas as situações que ocorrem dentro de seu país, sejam boas ou más. Se temos muitas notícias ruins, é porque temos muitos problemas – e desse fato o cidadão não pode se alienar, pois nele está contida a solução para o problema.

 

JP – Muitos brasileiros demonstram descrença no combate aos corruptos no país. Na sua opinião, qual é o processo para transformar essa realidade e por fim à corrupção?

 

Vivemos hoje no Brasil um momento único, uma grande oportunidade de estancarmos o grande mal que impede o crescimento de nossa nação. Esse grande mal é a corrupção. O povo, ao longo de nossa história, acompanhou grandes casos de corrupção acabarem sem grandes condenações e se frustrou com essa realidade. Porém, agora estamos em um relevante momento de engajamento social. O cidadão de bem deseja a mudança, porém, a mudança deve começar no próprio pensamento e atitude do povo.

 

JP – Muito se fala sobre a corrupção nas grandes esferas de poder. Entretanto, como esse processo se manifesta nas situações cotidianas dos cidadãos comuns?

 

Pequenos atos de corrupção são cometidos cotidianamente por grande parte da população: a sonegação de impostos, a compra de produtos pirateados, a não devolução do troco a mais recebido na padaria… Todos esses são alguns exemplos dos vários atos que são cometidos cotidianamente até mesmo por aqueles que desejam uma melhoria de nossa atual condição. Não existe corrupção em maior grau ou em menor grau; não devemos mais nutrir a famosa “Lei de Gérson”, na qual se prega que o brasileiro gosta de levar vantagem em tudo. A mudança de procedimento é necessária e cabível em todos os níveis sociais.

 

JP – Por que a corrupção se tornou um processo “naturalizado” no Brasil? Que caminho o país seguiu para chegar a esse cenário?

 

O Brasil não inventou a corrupção, mas ela está presente em nosso país desde os tempos coloniais. Padre Antônio Vieira, no sermão do bom ladrão, já dizia que os governantes não vinham de Portugal com o propósito de alcançar nosso bem, mas sim de alcançar nossos bens. Quando a família real aportou no Brasil, em 1808, fugida de Napoleão, não havia uma estrutura palaciana para a abrigar. Hospedou-se na Quinta da Boa Vista, então pertencente a um traficante de escravos, que foi agraciado com uma série de benefícios pela coroa. No transcorrer dos anos, a corrupção se enraizou em nossa sociedade a ponto das empresas internacionais com negócios aqui cunharem a expressão “custo Brasil”, ou seja, o valor que elas deveriam prever para o pagamento de propinas e subornos. Todas essas situações, ao longo dos anos, geraram a grave situação em que atualmente nos encontramos.

 

JP – O senhor acredita na força da Operação Lava-Jato e na condenação de grandes empreiteiros e políticos?

 

Tenho que acreditar, pois sou brasileiro e amo meu país. Quero um futuro melhor para os meus filhos. Desejo que eles convivam em uma sociedade mais honesta e gerida por pessoas de bem e de bom caráter. Por isso coloco minha crença no trabalho realizado pelos membros da Operação Lava-Jato; o trabalho desenvolvido até o presente momento já se mostrou como eficaz e tem cerceado a atuação de grandes esquemas de corrupção engendrados no passado. A condenação dos envolvidos nesses esquemas de corrupção deve ser uma consequência deste grande trabalho.

 

JP – As delações premiadas têm sido cada vez mais decisivas para o andamento das grandes investigações. O senhor acredita que elas são um método justo?

 

A delação premiada não tem valor nenhum quando desamparada de outras provas obtidas na investigação. Por muitas vezes, a delação premiada é o único caminho que os investigadores possuem para desvendar alguns esquemas de corrupção muito bem montados. A delação não se trata de um instrumento ilegal, pelo contrário, possui respaldo legal. Assim sendo, considero esta como um método justo.

 

JP – Que balanço o senhor faz sobre o trabalho realizado nos primeiros seis meses de existência da Comissão de Compliance e de Estudos de Combate à Corrupção, da OAB Itu?

 

Os primeiros meses da Comissão serviram para o alinhamento dos trabalhos que serão desenvolvidos. Foram feitos contatos com entidades e instituições de ensino superior visando a realização de palestras e eventos para a discussão dos relevantes temas relacionados ao combate à corrupção.

 

JP – Quais são os projetos para o futuro da Comissão?

 

De imediato, a nossa intenção é iniciar o ciclo de palestras e discussões. Também estamos trabalhando para a realização de um simpósio em nossa cidade, para o qual serão convidados advogados, professores, membros do Ministério Público, juízes e gestores públicos para debates sobre temas relevantes.