Restauração: investigando o DNA da história
Ao longo do tempo fatos e acontecimentos, lembranças e marcas constroem a identidade de um lugar, civilização ou povo. Berço de uma riqueza histórica e arquitetônica imensurável, as edificações de Itu escondem muito mais do que um simples olhar pode identificar. Desnudar o que existe por trás de camadas de tinta, pisos, traçados e estrutura de alvenaria é a missão de quem abraça o restauro como profissão.
“Compreender o porquê das coisas, como foram pensadas em suas origens a fim de revitalizar nosso patrimônio, é entrar em contato com nossa identidade”, destaca a arquiteta Vanessa Kraml, que desde março de 2017 é a responsável pelo Projeto Oficina Escola de Artes e Ofícios de Itu junto ao ProAc. Mantido na cidade através de incentivo do programa da Secretaria de Estado da Cultura, ProAC – ICMS, o Projeto Oficina Escola forma, desde 2009, turmas de adolescentes e jovens do Ensino Fundamental 2 da rede publica estadual, para trabalho de restauração, revitalização e conservação de patrimônio histórico.
No projeto, os alunos frequentam aulas de História da Arquitetura, Educação Patrimonial, Matemática, Português, entre outras disciplinas básicas. Também participam de aulas de Inclusão Digital e Elaboração de Projetos mediante a utilização dos programas AutoCAD, SketchUp, pinturas especiais, marcenaria, alvenaria moderna e tradicional, com objetivo de capacitá-los para participar do mercado formal de trabalho da construção civil, representado pelas atividades de restauração, preservação, revitalização e conservação dos 235 imóveis históricos de Itu tombados pelos órgãos de preservação do Patrimônio Histórico, e 32 fazendas históricas dos séculos XVIII e XIX existentes no município.
Vanessa, que possui em São Paulo escritório especializado em Arquitetura voltada a obras de restauração, tendo já ministrado aulas de História da Arquitetura e Educação Patrimonial para os alunos do projeto, destaca a importância de uma cidade como Itu de formar mão de obra especializada em restauro. “Hoje, é necessário trazer gente de fora para trabalhar, quando se poderia ter esse profissional aqui mesmo, na cidade”, frisa Vanessa. “Formar essa mão de obra é a principal missão do Projeto Oficina Escola. Também se adquire conhecimento da importância de preservar nosso patrimônio cultural, bem como de passar essa consciência adiante.”
Segundo ela, cada projeto de restauro que se inicia equivale a abrir uma “caixa de Pandora”. “Precisamos analisar a planta e o projeto original, quando existem; verificar os métodos usados na construção, os materiais e tecnologias utilizados originalmente. É uma verdadeira pesquisa histórica”, disse Vanessa, que define seu campo de atuação como Arqueologia da Arquitetura.
Na mesma linha, o engenheiro civil e professor das disciplinas de Pintura, Pinturas Especiais e Recuperação de Fachadas, e Alvenaria II do Projeto Oficina Escola, José Antônio Friguetto, destaca a importância de se conhecer as técnicas empregadas nas edificações ao longo dos séculos e da necessidade de uma pesquisa minuciosa sobre matéria-prima e estrutura, antes de se iniciar um projeto de restauração.
“Nas aulas de Pintura, por exemplo, ensinamos as técnicas gerais do processo, como mistura e tipos de tinta, como aplicar, uso de esmalte sintético e cuidado com as ferramentas. Numa segunda etapa, partimos para a aplicação de conhecimentos específicos dentro do processo de restauro predial, já que cada técnica de construção demanda o uso de um processo típico de pintura para que não haja danos”, explica.
Já em relação aos conhecimentos de alvenaria, o professor destaca que a estrutura de uma edificação tem relação direta com o período em que foi feita. “As técnicas usadas antigamente deixam suas marcas e devem ser respeitadas no momento da restauração e da pintura. Também nesses casos é importante se conhecer como se faziam essas técnicas, materiais, limitações dos processos, tipos de revestimentos usados. O objetivo é despertar nos alunos o senso crítico em relação às diferentes técnicas e métodos”, afirma Friguetto, que possui vasta experiência no Projeto Oficina Escola não somente em Itu, mas também em Santana do Parnaíba e no Ceará.