Um olhar de criança

Está ali, na seção MUNDO da Folha de São Paulo.

Com gorro de tricô, as duas mãozinhas segurando o queixo, apoiadas em plano horizontal que não se identifica, a criança olha para alguém ou alguma coisa que deve estar à sua direita, enquanto aguarda atendimento no hospital improvisado na cidade de Douma, no bastião rebelde de Ghouta Oriental, na Síria, explica a legenda da foto.

Seus olhos expressam não medo, mas incompreensão e certa acusação. Os lábios, fechados, mas com um esgar que demonstra (imaginem!) desconsolo e desesperança.

Tem no rosto um sinal de sangue. Ali está, à espera de atendimento. Demonstra, porém, claro descrédito diante de sua realidade.

Esta é uma criança síria. Mas poderia ser de qualquer parte do mundo…

Fico pensando: o que estamos fazendo com nossas crianças? Elas são as herdeiras do mundo que lhes preparamos!

E que mundo é esse? Será que nosso esforço para que os tempos delas sejam melhores do que os nossos estão bem direcionados e funcionam? Ou será que a preocupação geral é dar-lhes coisas, das mais sofisticadas e modernas, para que se sintam poderosas? E aquelas que não têm pessoas que lhes comprem coisas ou tais pessoas não têm como suprir-lhes com bens ou com metas a serem alcançadas?

São muitas, são inúmeras as perguntas.

Sentindo-me extremamente “pra baixo”, resolvo ler o artigo inteiro.

Ah, percebe-se ali verdadeira fogueira de vaidades entre atores internacionais, com a certeza de que “a operação militar contra Ghouda Oriental continuará”. E há ainda a “boa notícia” de que os civis terão permissão para fugir…

Meu Deus! Fugir para onde? E como? Famílias aterrorizadas, deixando suas casas e seus sonhos, em busca de quê??? E em meio aos bombardeios aéreos e de artilharia?

Uma verdadeira “punição coletiva inaceitável e ilegal sob a Convenção de Genebra” diz um alto dignitário de ORGANISMO HUMANITÁRIO (merece maiúsculas…) da ONU – Organização das Nações Unidas.

Diz, como muitos dizem muitas coisas…

Enquanto isso, sobejam relatos perturbadores de fome e de hospitais sendo bombardeados. Mais combates. Mais mortes.

E a “punição coletiva de civis” continua sendo “inaceitável”…

Suspirando profundamente, olhamos para o Brasil. O quadro tem outras cores, mas é igualmente desolador: “punição civil”. Também inaceitável? Qual a “Convenção” que o torna ilegal?

Ah, é uma convenção bem antiga. Muito antiga mesmo. Mas SEMPRE vigorando! As palavras são simples: “TUDO O QUE FIZERES A UM DESTES PEQUENINOS, É A MIM QUE O FAZES”.

E no último capítulo de imensa barbárie, a frase lapidar:

“PAI, PERDOA-LHES, POIS NÃO SABEM O QUE FAZEM”.

Maria Angela Pimentel Mangeon Elias

Cadeira nº 17 I Patrono Olívia Sebastiana da Silva