Como Itu viveu o Golpe Militar de 1964
O Golpe de 1964 é o nome que se dá à articulação que, entre 31 de março e 9 de abril de 1964, realizou a tomada de poder, subvertendo a ordem existente no país e dando início à Ditadura Militar, regime que se estendeu no Brasil de 1964 até 1985. Durante o golpe, o presidente então empossado, João Goulart, foi destituído de seu cargo.
A situação no Brasil era extremamente instável e, em março de 1964, tomaram-se as ações que definiram o destino do país. A conspiração dos grupos da extrema-direita estava a pleno vapor, e uma ação de Jango desencadeou de maneira antecipada o golpe no Brasil. Em 13 de março de 1964, foi realizado o Comício da Central do Brasil.
Esse comício, de acordo com as historiadoras Lilia Schwarcz e Heloísa Starling mobilizou de 150 mil a 200 mil pessoas. Nele, João Goulart reassumiu seu compromisso com a realização das Reformas de Base. O discurso de Jango deu a entender que o presidente havia abandonado a política de conciliação e que partiria na defesa das Reformas de Base junto aos movimentos sociais.
A reação conservadora foi imediata e ocorreu nas ruas no dia 19 de março com a Marcha da Família com Deus pela Liberdade. Essa passeata mobilizou mais de 500 mil pessoas em São Paulo contra o comunismo e reivindicando a intervenção dos militares na política brasileira. Essa passeata foi organizada pelo Ipes e deixou bem clara a extensão do poder dos grupos golpistas e o temor da classe média com as reformas e com os movimentos sociais que pipocavam pelo país.
No dia 31 de março, uma rebelião organizada por Olympio de Mourão deu início ao golpe civil-militar. Ele era comandante da 4ª Região Militar e iniciou uma rebelião em Juiz de Fora. Suas tropas marcharam em direção ao Rio de Janeiro com o objetivo de derrubar o governo. A rebelião de Mourão contava com o apoio do governador de Minas Gerais, Magalhães Pinto, e, em um primeiro momento, foi vista com desconfiança por membros das Forças Armadas, como Castello Branco.
Durante esses acontecimentos, João Goulart manteve-se totalmente inerte e não tomou ações efetivas para deter os militares que marchavam contra o seu governo. Os grupos da esquerda ficaram esperando uma ordem superior para uma possível resistência, mas essa ordem nunca veio. Jango tinha conhecimento de que o golpe em curso tinha o apoio dos EUA e sabia que uma resistência daria início a uma guerra civil – possibilidade rejeitada pelo presidente.
O grande aliado de Jango no exército, Amaury Kruel, retirou seu apoio a Jango, o que lhe colocou em isolamento e afastou as possibilidades de resistência interna nos quadros das Forças Armadas. Enquanto os militares marchavam contra o governo, os parlamentares brasileiros resolveram agir e, no dia 2 de abril de 1964, Auro de Moura, Senador da República, declarou vaga a presidência da República e abriu o caminho para que a Junta Militar tomasse o poder do Brasil. No dia 9 de abril, foi decretado o Ato Institucional nº 1 e a Ditadura Militar no Brasil começou a ganhar forma.
As vésperas do aniversário de 58 anos do golpe, o Periscópio ouviu moradores de Itu que comentam como foi o período na cidade. A professora Maria Angela Pimental Mangeon Elias, recorda que “1964 foi um ano emblemático”. “Decorridos mais de meio século, há muitos fatos que nos permitem modificar conceitos ou preconceitos”, frisa.
“Na época eu fazia parte do Movimento de Arregimentação Feminino – MAF e pude bem sentir o clima angustiante que estávamos vivendo. Algo precisava ser feito. E foi feito. O movimento de revolta contra o status que recebeu o nome de Revolução de 64 e, depois, de Golpe. Prefiro chamá-lo de Revolução. Isto porque, quando tenho dúvida, consulto o dicionário. Portanto, prefiro a palavra Revolução”, diz a professora.
“O poder constitucional foi formado por militares, pessoas bem preparadas, que estudaram para saberem como servir à Nação. Entretanto, eram pessoas humanas, passíveis de erros ou omissões, assim como capazes de enfrentar qualquer tipo de situação. Assim também acontecia com as pessoas da oposição. Precisamos considerar que, de ambas as partes, houve exageros e até crimes, desde que é mais fácil chegar a conclusões após a passagem de algum tempo”, destaca Maria Ângela.
“Lembro-me de que tivemos dias e anos de relativo sossego e de muita preocupação, com as pessoas obedecendo ou, então, se rebelando contra as ordens emanadas do governo. Tive e tenho vários amigos militares, sem nenhum problema. Assim como tenho amigos e até parentes de alguma forma marcados por essa Revolução”, acrescenta a professora. “Mas havia também ‘o outro lado’, também com suas atividades, o que resultou na tão esperada ‘Democracia’, que vivemos e que, de certa forma, bastante perdeu de seu significado etimológico”, aponta a educadora.
Prefeito de Itu por quatro mandatos, Lázaro José Piunti era um jovem estudante de 16 anos em 1964 e, ao JP, ele recorda o cenário em Itu. “O prefeito era João Machado Medeiros Fonseca. Ele ficou favorável ao movimento militar e inclusive, palavras dele, reservou recursos nos cofres municipais para socorrer o grupo militar que estava saindo nas ruas”.
“Houve apreensão de veículos, inclusive um caminhão do Colégio Nossa Senhora do Patrocínio foi requisitado pelo Exército e, em Itu, a grande figura democrática era do Partido Comunista, mas uma pessoa com vocação democrática que era o Dr. Ermelindo Maffei. Foi preso, foram presos dirigentes sindicais, depois liberados. Foi um momento complicado”, recorda Piunti. O ex-prefeito prossegue. “O Quartel de Itu foi para a linha de frente, viajou para a região do Vale do Paraíba para enfrentar as tropas de Minas Gerais que vinham em direção ao Rio de Janeiro. Me lembro com nitidez de toda a situação. Os irmãos Marchi tinham grande estoque de alimentos e João Machado requisitou também se necessária a apreensão de alimentos para atender o Exército”, conclui.
Texto muito interessante, e que tenho certeza de que poderia ainda render um artigo muito maior. Sempre quis saber um pouco mais de como era a vida em Itu nessa época sombria. Obrigado por isso