Artigo: Assim caminha a humanidade

Por Éden Santos*

Lendo o jornal cotidiano, dias atrás, deparei-me com um pensamento que me deixou um tanto intrigado. Tão intrigado que ele vem martelando na minha cabeça desde então. Era mais ou menos assim: Mudança é a única coisa permanente e a incerteza a única certeza. Seu autor, o sociólogo e filósofo polonês, já falecido, Zygmunt Bauman acrescentava que isso vinha crescendo dentro de si como uma insuspeitada convicção. Então, tomei a decisão de dissertar sobre a aparente contradição. Ora, à primeira vista os vocábulos mudança e permanência, são palavras antônimas, assim como são a certeza e incerteza. Com efeito, teoricamente, se há mudança não há permanência, ou se há certeza não existe incerteza. Mas, a filosofia é um poço profundo de sabedoria. O que o autor coloca diante de nós é de que no mundo atual, ou talvez desde sempre, a constante é a mudança desde os primórdios da civilização. Portanto, ela se insere de um modo irreversível e definitivo no desenvolvimento e mutação civilizatório. Não fora isso, estaríamos ainda num estágio de primatas. Isso tudo é válido dentro da doutrina do evolucionismo. Entretanto, sabemos que além dessa doutrina, isto é, a do evolucionismo, temos a do criacionismo, cuja tese é totalmente oposta sobre a origem do homem. Para os criacionistas o homem é criação de Deus como diz a Bíblia no seu segundo capítulo de Gênesis e ponto final. Desse modo até poderíamos depreender que o respeitado Bauman seria um agnóstico, mas não é o caso em discussão no presente artigo. Vamos em frente! Abordemos, agora, o substantivo certeza. Ah! Certeza! Platão joga um foco de luz sobre ela ao afirmar que é possível a certeza somente sobre coisas estáveis, porque as coisas mutáveis são incertas, apenas prováveis. E aí o nosso caro Bauman acerta o alvo no campo das coisas prováveis, ou seja, temos aí a incerteza do ser ou não ser. Recorrendo novamente ao elemento religioso o Cristianismo adota uma certeza subjetiva consistente na fé. A partir disso São Tomaz de Aquino argui que existem duas formas de considerar a fé. Na primeira, considerada de causa, na qual a fé é mais certa do que a sabedoria, a ciência e o intelecto. Na segunda, alicerçada no objeto, é determinada pela razão, sendo, portanto, a primeira com um caráter subjetivo e a segunda com caráter objetivo.

Feitas essas considerações entendo ser oportuno volver um olhar sobre como a humanidade vem se comportando diante da dicotomia de mudança/permanência e incerteza/certeza. Na verdade a humanidade vem encetando uma vertiginosa corrida rumo ao futuro. Empresas e cientistas das mais variadas cores ideológicas estão planejando e trabalhando freneticamente para, incrível, antecipar o futuro. Nesse clima o curto prazo ficou para trás e o longo prazo está cada vez mais curto. Os Estados (países) sobrevivem a reboque dessa devastadora realidade. As grandes corporations, embora tangenciadas pelos governos, vêm de maneira determinada num surdo conluio entre elas, agigantando-se e definindo na maioria das vezes o comportamento da humanidade. Algumas décadas atrás a indústria era o motor da economia global. Já não o é mais. Serviços, e dentro deles, tecnologia, tomaram a liderança a que havíamos nos acostumados. Em 2050, como serão as coisas? Essa é a incerteza que, com certeza temos. No caso da mudança não sobra qualquer dúvida de que a humanidade está totalmente enlaçada por ela. Até países com sistemas políticos arcaicamente fechados têm se rendido à tecnologia. Numa viagem que fiz com minha esposa a Cuba, há algum tempo, pudemos constatar que apesar das dificuldades do seu povo com enormes restrições de renda e liberdade política, cada jovem dispunha de modernos celulares, resultado da penetração das corporations, que não conhecem fronteiras. Como disse Bauman, “mudança é a única coisa permanente”. E assim continua a saga da humanidade.

* É escritor. Site: www.edensantos.com. E-mail: edensantos@uol.com.br.