Brasília: uma velha modernidade

Por Marcelo Augusto Paiva Pereira

*Brasília foi inaugurada aos 21.04.1960 durante a administração de Juscelino Kubitschek, que almejava realizar a vontade política de erguer a capital do pais no planalto central firmada na Constituição da República (1891). Assim deveria para protege-la das invasões ultramarinas, levar o progresso ao interior do país e integra-lo em sua plenitude.

Queria, também, que fosse um projeto moderno, que representasse o dinamismo, o pioneirismo desbravador e audacioso do seu governo. Coube a Lúcio Costa e a Oscar Niemeyer elaborá-lo. O primeiro fez o projeto urbanístico, em forma de pássaro ou avião, composto de diversas superquadras, enquanto o segundo fez os projetos dos edifícios que povoaram a nova capital.

O projeto urbanístico foi pensado para atender às funções do trabalho e da moradia e em três foram as propostas: a) organizar a cidade com suporte no zoneamento de funções (tipologia das funções urbanas e das formas de edificação); b) concentrar os lugares de trabalho e dispersar as habitações; c) criar a superquadra para organizar as habitações.

Em Brasília cada zona urbana é definida pelo zoneamento de funções, distribuído nas superquadras. Cada superquadra é uma unidade residencial autossuficiente e a unidade familiar é suprimida e dirigida às dependências comuns (creches, escolas, clínicas, postos de saúde, farmácias, lojas, cozinhas, etc).

As superquadras causaram a sensação de isolamento por ter suprimido a rua como espaço de convívio e a familiaridade com a vizinhança. As pessoas querem as ruas para passear, caminhar, conversar, reunirem-se com outras, fazer alguma atividade extra domiciliar e as superquadras as retiraram (ou as mitigaram) de seus habitantes.

 A tipologia dos edifícios, entretanto, não segue à forma definida pela função. O desenho dado a eles não distingue nenhuma função nem pela forma nem pelas escalas. Esta uniformidade frustrou a ideia modernista de atribuir identidade às zonas urbanas pelas formas derivadas das funções dos edifícios. O efeito foi a monotonia urbana e espacial do “skyline” da cidade.

 Quanto aos apartamentos funcionais, os projetos preservaram a divisão tripartite da habitação brasileira (áreas social, íntima e de serviço), mas teve modificado o acesso a eles, com a supressão da entrada de serviço,da copa e da sacada de cada apartamento.Patrão e empregado entram pela mesma porta de acesso. Os moradores consideraram habitações “antifamílias” porque contrariaram a solidariedade e as estruturas sociais da tradicional família brasileira.

 O desenho urbano e arquitetônico de Brasília almejou negar as diferenças econômicas, os estilos sociais, as convicções políticas e a competitividade entre os indivíduos. Pretendia igualar a todos, garantir o acesso aos múltiplos bens e serviços da cidade e preservar a sociedade burguesa ou capitalista sem as disparidades econômicas e sociais que caracterizavam as cidades anteriores a ela. Em suma, pretendeu-se por uma sociedade e cidade modernista, capitalista, futurista e igualitária, na qual as classes sociais teriam maior proximidade entre elas. Nada a mais.

É arquiteto e urbanista.