“Observo ações racistas muito frequentes na nossa cidade”, afirma Rosália Maria
Rosália Maria Rodrigues de Campos, mulher preta, filha da Irene, neta da Dona Ismênia. Esposa, mãe e avó. Assim se apresenta a mais nova homenageada com o Diploma e Medalha Zumbi dos Palmares, honraria que será entregue pela Câmara de Vereadores no próximo dia 23 de novembro, às 19h, no Espaço Fábrica São Luiz.
Instituída através da Lei Municipal Nº 1306, de 22 de fevereiro de 2011, a honraria faz parte das comemorações do Dia da Consciência Negra, celebrado em 20 de novembro, e é destinada a pessoas que colaboram para a divulgação de vida e obra de Zumbi dos Palmares ou que, de alguma forma, trabalham para combater o preconceito e a segregação racial.
Psicóloga, professora adjunta, graduada em Ciências Biológicas, pós-graduada em Educação Social e Mestra em Educação pela Unicamp, Rosália Maria também é membra do Grupo DIS, que realiza pesquisas voltadas para Educação das Relações étnico-raciais, classe e gênero, além de ser palestrante, presidenta do CMDMI (Conselho Municipal dos Direitos da Mulher Ituana) e suplente no Conselho da Saúde representando a UNEI (União Negra Ituana).
Nascida em Itu há 59 anos, Rosália se sente extremamente lisonjeada com a homenagem. “Trata-se de um reconhecimento às pessoas que estão constantemente trazendo ações de enfrentamento e valorização do povo preto. Esta medalha e diploma traz o nome do primeiro herói brasileiro, o que faz com que minha responsabilidade seja ainda maior, com muito mais comprometimento diante dos meus movimentos em relação ao meu povo. Pois Jurema Werneck, médica, ativista, feminista negra, nos orienta que nossos passos vêm de longe”, conta ela.
Neste ano, Rosália já havia sido homenageada com o Diploma e Medalha Mulher Ituana, outra honraria do Legislativo ituano. “Quando recebi o Diploma e Medalha Mulher Ituana, me vi responsável por representar mulheres ituanas e principalmente mulheres negras ituanas que pavimentaram esta minha caminhada, como minha avó Ismênia e minha mãe Irene, entre tantas outras. Agora, ao receber este diploma, entrego a toda nossa ancestralidade”, declara.
Para Rosália, houve avanços na luta antirracista nos últimos anos, mas ainda falta muito. “Os avanços sempre existiram, não porque nos foram concedidos por benevolência, mas porque toda nossa ancestralidade conquistou por intermédio de muita luta, de estudos, comprovação diante de dados científicos que desmascaram o mito da democracia racial e escancaram o racismo nosso de cada dia. Mas, se formos considerar que a cada 23 minutos um homem negro é morto no país, percebo uma necessidade de extrema urgência para acabar com este genocídio”, afirma a homenageada, lembrando que o racismo é estrutural e atravessa todas as relações humanas.
Reflexão
Rosália também reitera a importância do Dia da Consciência Negra para a reflexão. “Além de celebrar a vida e toda trajetória do nosso herói [Zumbi dos Palmares], ainda apresenta vitória diante da luta de todos/as africanos/as da diáspora, diante de toda violência sofrida pelo racismo estrutural”.
A psicóloga afirma que na cidade de Itu o racismo está presente em vários espaços. “Peço sempre que as pessoas façam o ‘teste do pescoço’: observem onde as pessoas negras se encontram, qual função elas exercem, como são tratados os equipamentos onde são maioria como usuários, como estas pessoas são atendidas, ouvidas… Eu observo ações racistas muito frequentes na nossa cidade. Tenho tido diálogos a respeito da luta antirracista com a Secretária de Cultura e o Secretário de Educação, percebo que estamos construindo pontes e espero que possamos efetivar estas promessas”, aponta.
Para ela, o “pacto da branquitude” sustenta a desigualdade no Brasil. “A branquitude precisa se responsabilizar pela criação e manutenção do racismo, a branquitude neste momento passa a ser o objeto de pesquisa. A branquitude precisa reconhecer seu lugar, toda dimensão que afeta e ressignificar”, encerra.