Espaço Acadil: O Rei Nu

Guilherme Del Campo
Cadeira nº 11 – Patrono Mario de Andrade

Havia um reino deveras inusitado, conhecido por Terra Papagallis, cujo castelo futurista às margens do lago Patacoada, era habitado por um monarca boquirroto e excêntrico por excelência, que só falava asneiras e desacatos e que diariamente em sua alcova, mirava-se nu em seu espelho mágico, com ares de absoluto e incontestável rei.

            – Quem é o rei poderoso em Terra Papagallis?

            O espelho mágico, apetrecho frio e cruel, que já se livrara das perguntas cretinas e invejosas da famosa madrasta, enfadado com as frescuras virginais da Branca de Neve, dos estrepitosos peidos dos anões de sovacos asfixiantes, reserva-lhe respostas soturnas.

            – O verdadeiro rei está por chegar. – dizia o espelho.

            O rei nu sentia-se injuriado diante de tal afirmativa. Até porque não aceitava ser contrariado. Se qualquer ministro discordasse das suas opiniões, ou fizesse sugestões que não o agradavam, era substituído ou exonerado.

            O espelho deu um suspiro, apagou-se e entrou em greve por tempo indeterminado.

            Naquela manhã, seu ministro da Casa dos Ducados, conhecido como “Papo Leve”, trouxe-lhe notícias e se apresentou:

            – Amado e venerável monarca, temo trazer más notícias. Uma ruim e outra pior.

            – Mas que notícias são essas? – perguntou o monarca já irritado.

            – O povo está sem emprego, não pode comprar feijão, arroz e vive nas ruas da amargura. A fome obrigou-os a caçar morcegos para os devorar. Mas não os mande comer brioches, como aquela rainha idiota que, para acabar com o pescoço coceguento, enfiou a cabeça debaixo de uma afiada guilhotina e, deu no que deu.

            – Essa é uma má notícia! Esse povo esfaimado pode contaminar-se com os vírus e isso pode significar uma epidemia. Mas se isso acontecer vamos distribuir a Clorovida!

            – E a pior? Quero saber da pior?

– Os arautos clandestinos gritam, a boca pequena, que a sua “batata está assando”!

            – O que isso quer dizer? – perguntou o aflito rei.

– Que o antigo rei, o “sapo-barbudo”, condenado por desvio dos ducados do reinado, foi absolvido por ministros míopes e está arregimentando um exército para destituí-lo do cargo e tem o apoio incondicional dos vassalos esfomeados.

            – Mas os vassalos já o perdoaram?

            – Amado rei, os vassalos têm memória fraca e para piorar as coisas o “sapo-barbudo” os está ajudando a caçar morcegos.

            – Além disso, o povo critica as mentiras e o pouco caso do Rei com o meio ambiente, desmatamentos ilegais, queimadas, garimpos em terras indígenas, agressões à natureza, o aumento da corrupção e o tal de deixa “passar a boiada”. Assim, estão dispostos a apoiar o movimento do “sapo-barbudo”, para retomar o reino de Terra Papagallis.

– Isso é guerra!

            “Papo Leve” calou-se e abanou a cabeça negativamente. Preocupado com o “batatas assando”, O Rei Nu ficou pensativo e achou melhor enfiar as mãos nos bolsos!