Trabalho de compositores é mantido pelo Museu da Música

Partitura original inédita de Miguel Dutra, datada do século XIX, no acervo da Pinacoteca do Estado de São Paulo (Foto: Reprodução/Museu da Música de Itu)

Neste domingo (15) comemora-se o Dia Mundial do Compositor e, na cidade de Itu, há 15 anos existe o Museu da Música, que tem como objetivo preservar o trabalho secular de compositores do município. O espaço conta com aproximadamente 10 mil partituras em seu acervo, resultado de um grande trabalho de pesquisa liderado pelo historiador, professor e maestro Luís Roberto de Francisco, curador do museu.

Ao Periscópio, ele comenta. “A atividade do compositor trafega entre a criatividade e a oportunidade de uma sociedade em produzir música para si mesma. Desde o século XVIII temos obras musicais escritas em Itu, fruto do patrocínio de uma parcela enriquecida e desejosa de exibir os seus haveres através de concertos e cerimônias religiosas”.

Ainda segundo o historiador, o repertório sacro tem no padre Jesuino do Monte Carmelo “o mais antigo dos compositores conhecidos, passando por Miguel Dutra e Tristão e José Mariano, por exemplo, que deixaram belas páginas da composição religiosa.”

Historiador e professor, Luís Roberto de Francisco realiza importante trabalho de preservação da música em Itu (Foto: Arquivo/Jornal Periscópio)

“A música profana, para entretenimento, teve diversos compositores, desde os antigos mestres de banda, como Elias Lobo, alguns italianos e aqueles que se destacaram no século XX, como Isaías Belculfinè e Cyro Rocha. As serestas tiveram o especial compositor Tristão Junior. Muitas dos originais dessas obras estão conservados no Museu da Música”, destaca o professor.

Luís Roberto de Francisco destaca ainda a importância do acervo. “A sua divulgação revela a descoberta de um patrimônio cultural imaterial fundamental à manutenção da memória que, por fim, dá sentido à existência das gerações atuais”.

O Museu da Música guarda em seu acervo a primeira ópera brasileira escrita em língua portuguesa por um brasileiro e justamente em Itu. Trata-se de “A Noite de São João”, escrita em 1858 por Elias Álvares Lobo (1834 – 1901) e apresentada na Corte de D. Pedro II no Rio de Janeiro.

A obra musical, escrita sobre libreto de José de Alencar, ficou guardada por 150 anos em arquivos da família Lobo e Belculfinè, em Itu, até que veio para o Museu da Música, onde começou a ser divulgada em trechos pelo Coral Vozes de Itu. Mas uma parceria entre o museu mantido pelo Instituto Cultural de Itu e o Conservatório Dramático e Musical “Carlos de Campos”, de Tatuí/SP, permitiu que ela voltasse à vida integralmente.

O Museu da Música fez a digitalização das partituras originais para piano e canto, que foram orquestradas novamente pelo compositor Mateus Araújo. A direção cênica coube a Rosana Orsini Brescia. A apresentação ocorreu em 7 de dezembro do ano passado, no Teatro Procópio Ferreira, em Tatuí.

Sobre a sequência de atuação, Luis Roberto comenta à reportagem que, para 2023, o Museu da Música continua trabalhando em associação com o Coral Vozes de Itu e Schola Cantorum para divulgação do repertório dos compositores ituanos. Em fevereiro, com o início da quaresma, será possível ouvir as obras religiosas do padre Jesuino, de Elias Lobo e Tristão Mariano em diversas igrejas da cidade até a Páscoa. Mais informações sobre o Museu da Música de Itu podem ser obtidas através do site: https://www.museudamusicaitu.com.br/.

Principais compositores | Ao longo da história, alguns nomes marcaram época na música ituana. Confira alguns deles:

  • Padre Jesuíno do Monte Carmelo (1764-1819) santista, foi um dos maiores artistas do período colonial na então Capitania de São Paulo. Viveu em Itu desde os 17 anos. Sua obra tem sido estudada por especialistas em diversas áreas, em universidades, cada vez mais caracterizando o aspecto inventivo e peculiar da obra do padre mulato. Foi pintor, escultor, arquiteto, construtor, compositor, intérprete, mestre de capela e cantor, além das atividades de um fac totum da igreja. No campo da música, escreveu obra sacra, recuperada, nos anos de 1960, pelo Prof. Regis Duprat e transcritas pela Profª Lenita Nogueira. Destacam-se as Matinas do Menino Deus e a Ladainha em Sol menor.
  • Miguel Dutra (1812 – 1875) Mais conhecido como artista plástico, o compositor nasceu em Itu e morreu em Piracicaba. Escreveu música sacra e música de salão, além de hinos comemorativos. Sua obra, até 2010 era desconhecida em Itu. Revela extraordinária e inesperada qualidade composicional, provavelmente inspirada no trabalho de seu mestre, Frei José de Santa Delfina.
  • Elias Álvares Lobo (1834 – 1901) Importante compositor e regente, nasceu em Itu e, ainda criança, ficou órfão. Começou a estudar música na banda da cidade e iniciou-se compondo para a igreja e para festas de salão. Posteriormente estudou em São Paulo e no Rio de Janeiro com o compositor do Hino Nacional Brasileiro, Francisco Manuel da Silva. Em 1858 escreveu a ópera “A noite de São João”. Viveu em Itatiba, Campinas e São Paulo. Durante 50 anos Elias Álvares Lobo compôs 15 Missas, toda a Semana Santa, duas Óperas, centenas de pequenas peças profanas, para piano e canto, além de dobrados para as bandas.
  • José Mariano da Costa Lobo (1857 – 1892) Filho de Joaquim Mariano da Costa e Umbelina Lobo de Albertim, Zezinho Mariano teve a ventura de estudar música com seus tios Elias Álvares Lobo e Tristão Mariano da Costa, tornando-se um prodigioso compositor aos 19 anos. Exerceu a atividade de Mestre de Capela em Itu por uma década, tempo em que compôs música sacra. Foi também atuante na música marcial e nos conjuntos que promoviam saraus nas casas da elite ituana. Suas peças conhecidas são executadas durante a Procissão de Passos, na Semana Santa, os Motetes, especialmente escritos para a cerimônia. Foi o primeiro organista do órgão Cavaille-cóll da Matriz de Itu. Morreu precocemente na epidemia de Febre Amarela em maio de 1892. Deixou filhos, entre eles o músico Humberto Costa.
  • Tristão Mariano da Costa Júnior (1880-1935) foi um dos maiores compositores ituanos no século XX. Filho do Maestro Tristão Mariano da Costa e da cantora Maria Augusta da Costa, e sobrinho do compositor Elias Lobo, seguiu os passos da sua família de compositores. Escreveu, sobretudo, música de seresta (valsas, tangos, schottischs e polcas). Tristão Júnior dedicou-se também ao magistério. Foi professor de Música no Colégio São Luís, no Instituto Borges e no Ginásio do Estado (Escola Regente Feijó). Tornou-se uma referência no ambiente artístico ituano, seja como compositor, como seresteiro ou como mestre de capela da Igreja Matriz.