Um bode inesquecível

J. C. Arruda

Tem alguns personagens de Itu que, nestes quatro anos de existência da coluna Histórias e Milongas, predominaram com suas aventuras. O principal deles, o Antonio Trapachini, foi o grande destaque com inúmeras aparições, pois suas histórias, embora exageradas, sempre foram interessantes. Teve o Espirro e o Pedro Cabra que marcaram suas vidas em Itu. O primeiro como artista plástico reconhecido por sua criatividade, tanto como pintor, como escultor e, mais ainda como artista popular do humor. Já o Pedro Cabra que nunca foi artista, levou a vida em Itu, sempre criando malandragens e fazendo delas seu meio de vida. Graças a Deus, Espirro continua forte e saudável, sempre dando o ar de sua graça nos eventos da cidade, enquanto que Pedro Cabra mudou-se para a cidade de Outucupira, a qual ninguém conhece, mas ele garante que existe na divisa do Brasil com a Bolívia e o Paraguai.

Só que hoje vou falar de um outro querido personagem que já ocupou por diversas vezes esta coluna e que veio a falecer no ano passado, deixando saudades: João José Bolognesi, o Bodinho. Antes de mais nada convém repetir que Bodinho foi bom jogador de futebol e futebol de salão, excelente trabalhador, funcionário exemplar na indústria Verdés e quando se candidatou a vereador nas eleições de 1972, não apenas foi eleito, como foi um dos melhores da Câmara Municipal. São raros os vereadores atuais que poderiam se comparar ao Bodinho, pois ele era bom na tribuna e fora desta melhor ainda, porque era sério e não se vendia a interesses políticos e financeiros.

Porém, o nosso herói, jamais deixou de ser a figura alegre, espirituosa e criativa que sempre foi, estivesse “por cima ou por baixo da carne seca”. Nunca deixou passar qualquer oportunidade para fazer uma gosação. Certa vez, ele jogava futebol de salão no Grêmio Paula Souza e foi com a equipe fazer um jogo amistoso e noturno, contra o Comercial de Tietê. Quem transportava a delegação como de costume, era o Durvalino Bersani, estimado por todos os jogadores. No retorno de Tietê, para Itu, vinha todo mundo cantando, assobiando, zoando enfim e o Bersani vinha pedindo silêncio e cuidado para evitar algum acidente. Quando a Kombi se aproximava de Porto Feliz, começou a ziguezaguear na pista e o motorista parou para ver o que era. Todos desceram e ficaram em volta de Bersani, enquanto este examinava o pneu direito da frente que estava murcho. Apalpando o pneu naquela escuridão, o motorista concluiu e falou: – “Olha gente, é um prego que perfurou a borracha e vou ter que colocar o estepe”. Todos se apressaram em ser solidários com ele, mas Bodinho não resistiu e foi perguntando: – MAS, BERSANI, COMO É QUE VOCÊ NÃO VIU O PREGO, NA ESTRADA? PRECISA FICAR MAIS ATENTO…

No fim de tudo, até Bersani caiu na risada junto com os outros.

Bodinho gostava de contar também que houve um período de tempo que ele tinha uma incômoda dor de cabeça. Não havia Melhoral, Cibalena ou chá-de-boldo que dessem um jeito. Certo dia resolveu enfrentar o médico. Foi no Doutor Chebel, que havia sido Prefeito da cidade e de quem Bodinho era eleitor. Chegou no consultório, foi examinado com carinho pelo bondoso médico que lhe receitou um remédio que seria tiro e queda. Na hora de pagar, a consulta era 150 cruzeiros mas Bodinho pechinchou tanto que acabou ficando por 100 cruzeiros. Ele fez o cheque e deixou com a Sandra, secretária do Doutor. Passado uma semana, Bodinho recebeu um telefonema do próprio Chebel: – “Ô, Bolognese, não queria lhe chatear, mas o cheque que você me deu, voltou!” E o Bodinho, em cima da bucha: – “Pois é Doutor, acontece que a minha dor-de-cabeça também voltou…”

Toda vez que o Bodinho contava essa milonga, sempre tinha alguém que perguntava: – “Mas, então por que você pechinchou tanto no preço da consulta?” E o Bodinho explicava: – “Era para o Doutor perder menos…”